I
Sendo cada vez mais raro o apreço por questões relacionadas por congruência lógica (afinal se cada um tem uma opinião da realidade tão válida como a própria realidade em-si), cabe ao observador permanecer calado e observar as pequenas pistas que aparecem aqui e ali além da tinta do choco que visa apenas cobrir a mão que embala o berço.
A questão da igualdade de tratamento de géneros é pródiga em facultar exemplos desta ilusão intencional que sob a tinta de choco da ‘igualdade’, apenas promove o poder de uns sobre outros.
Há uns tempos atrás falava-se mais do ‘mansplaining’ e ‘manspreading’ chegando-se até a propor que ter testículos era um embaraço para outros e que, portanto, em locais públicos a posse do mesmo devia forçar a um espremer voluntário entre as coxas, para não incomodar outros que não possuem tomates.
De um certo ponto de vista até há coerência nisto, pois esconder os tomates da presença pública vai em concordância com a anulação da masculinidade genérica que as sociedades ocidentais promovem sob a tinta de choco de recriar um mundo mais justo e repor o equilíbrio opressivo que durante milénios terá supostamente oprimido as mulheres, embora nos últimos 8000 anos para cada homem que se reproduziu, reproduziram-se 17 mulheres, o que dá que pensar sobre essa suposta opressão sob o ponto de vista biológico.
O ‘mansplaining’ baseia-se na ideia de que qualquer portador de pénis que tenha de transmitir informação a um não portador de pénis, deve fazê-lo de forma a não ofender os sentimentos do receptor, de forma a não humilhar, ou seja, bastaria o sentimento do indivíduo não portador de pénis para aferir se uma forma de expressão é ou não humilhante, sarcástica ou condescendente.
Legisle-se, portanto, sobre a espontaneidade das pessoas, tendo por base o sentimento das mesmas.
Mas atenção, pois mais uma vez, só os homens são passíveis de cometer este crime social. E daí chamar-se ‘mansplaining’.
II
A propaganda/publicidade são barómetros óptimos de aferição do zeitgeist, das leis nãos escritas, dos paradigmas da moda, em relação ao que é ou não admissível ou expectável. E por isso se extinguiram os anúncios onde a mulher apareça a fraca luz, ou imbecilizada. Ou arrogante ou outra qualquer qualidade negativa. Ao que parece, todas as qualidades negativas foram monopolizadas pelos portadores de pénis, esses seres inferiores, que só sabem oprimir e ser …parvos.
Talvez seja das alterações climáticas, os defeitos das mulheres não só desapareceram, como se alteraram, passando a ser virtudes. À mulher intratável, chamamos de espirituosa. À mulher sociopata, chamamos de competitiva. Toda uma novilíngua que visa esbater a fronteira do reprovável, de modo a retirar toda e qualquer responsabilidade de o ser não portador de pénis poder ser avaliado com um ser humano sofrível.
A coisa está tão deliciosa, que qualquer nota sobre o facto de que o não portador de pénis ser humano e padecendo dos mesmos defeitos de carácter que os demais, é considerado de ódio contra as mulheres.
Quem controla o discurso, controla o pensamento, e o discurso comercial publicitário, é uma forma de controlo de linguagem e de ideias. Ajuda a criar um ambiente social, que transfere para os indivíduos um sistema de valores.
III
No anúncio sobre a televisão smart, o actor representa o arquétipo do homem retratado pela propaganda nos últimos 25 anos.
Parvo, panhonha, apalhaçado, boçal e limitado intelectualmente.
Ela, sabida, esperta, vivaça, conhecedora, competente, independente e bastião de autoridade.
Ambos de pele clara, olhos claros, e cabelos louros ou aloirados. O padrão nórdico, portanto, a servir de padrão num país mediterrânico, racialmente complexado.
O perfeito casal ariano moderno, exemplar da maioria da população portuguesa, que só ainda não emigrou para a Argentina en masse porque Portugal está na moda e gostamos dos chouriços e queijos daqui.
Relembro que um anúncio publicitário, só é eficaz na medida em que se servir do modus operandi mefistofélico, isto é, o seu maior truque é convencer sem deixar perceber que é convencimento, convencer que é só uma rábula engraçada, um episódio de humor anestesiante sem outro motivo que não informar para um produto ou funcionalidade. Sem qualquer carga ideológica implícita.
E isto apesar de ser feito por um batalhão de pessoas que estudaram ciências do convencimento, desde a Psicologia à construção civil, escalpelizando os medos, receios, ansiedades, complexos e aspirações do cidadão médio, para melhor o manipular, ou convencer a adquirir produtos.
Por isso, a projecção contínua de querubins nórdicos, e de homens imbecis não pode nem deve ser tomada como inócua de intenção.
O tipo do anúncio é um básico, uma ideia feita, um pré conceito, em que o homem é simples e simplório, que só concebe que uma televisão smart sirva para assar bifanas, ou para jogar um jogo com um disco e duas balizas.
Boa parte dos homens identifica-se com este arquétipo projectado, gostam de se pensar como simplórios, tal como o discurso feminista os retrata. Quase que agradecendo por existir e pelo potencial favor erótico que pode avir da sua complacência. Acreditam que é assim que se joga o jogo, até porque nunca exercitaram muito a espinal medula, e, portanto, é difícil de a manter…erecta.
Interiorizaram a alegada opressão passada aos não portadores de pénis, e tomam-na como sua responsabilidade.
Riem com a figura do ‘bócó’ do anúncio, que com o seu limitado limiar de concentração, delira com imbecilidades à primeira questão colocada pela interlocutora. Há uma espécie de regozijo com esta simplificação, talvez por os fazer sentir mais próximos do retrato do homem bruto de cavernas idas, expurgado hodiernamente destas sociedades polidas.
No segundo anúncio, da ‘netflick’, a cabeça do homem aparece como lugar de descanso dos pés da fêmea enfadada com um serão burguês, restrito à televisão normal.
O que devemos perguntar não é qual seria a nossa reacção se fosse um portador de pénis a repousar os pés na cabeça de um não portador de pénis, mas porque é que achamos isto como algo passível de ser engraçado.
Tal como devemos perguntar, se no anúncio da tv smart, não estamos sobre um exemplo de ‘womansplaining’ glorificado, onde a coerência lógica para uma ideia de igualdade estrita, se perde sobre uns esgares a que chamamos ‘sorrisos’.
Sendo cada vez mais raro o apreço por questões relacionadas por congruência lógica (afinal se cada um tem uma opinião da realidade tão válida como a própria realidade em-si), cabe ao observador permanecer calado e observar as pequenas pistas que aparecem aqui e ali além da tinta do choco que visa apenas cobrir a mão que embala o berço.
A questão da igualdade de tratamento de géneros é pródiga em facultar exemplos desta ilusão intencional que sob a tinta de choco da ‘igualdade’, apenas promove o poder de uns sobre outros.
Há uns tempos atrás falava-se mais do ‘mansplaining’ e ‘manspreading’ chegando-se até a propor que ter testículos era um embaraço para outros e que, portanto, em locais públicos a posse do mesmo devia forçar a um espremer voluntário entre as coxas, para não incomodar outros que não possuem tomates.
De um certo ponto de vista até há coerência nisto, pois esconder os tomates da presença pública vai em concordância com a anulação da masculinidade genérica que as sociedades ocidentais promovem sob a tinta de choco de recriar um mundo mais justo e repor o equilíbrio opressivo que durante milénios terá supostamente oprimido as mulheres, embora nos últimos 8000 anos para cada homem que se reproduziu, reproduziram-se 17 mulheres, o que dá que pensar sobre essa suposta opressão sob o ponto de vista biológico.
O ‘mansplaining’ baseia-se na ideia de que qualquer portador de pénis que tenha de transmitir informação a um não portador de pénis, deve fazê-lo de forma a não ofender os sentimentos do receptor, de forma a não humilhar, ou seja, bastaria o sentimento do indivíduo não portador de pénis para aferir se uma forma de expressão é ou não humilhante, sarcástica ou condescendente.
Legisle-se, portanto, sobre a espontaneidade das pessoas, tendo por base o sentimento das mesmas.
Mas atenção, pois mais uma vez, só os homens são passíveis de cometer este crime social. E daí chamar-se ‘mansplaining’.
II
A propaganda/publicidade são barómetros óptimos de aferição do zeitgeist, das leis nãos escritas, dos paradigmas da moda, em relação ao que é ou não admissível ou expectável. E por isso se extinguiram os anúncios onde a mulher apareça a fraca luz, ou imbecilizada. Ou arrogante ou outra qualquer qualidade negativa. Ao que parece, todas as qualidades negativas foram monopolizadas pelos portadores de pénis, esses seres inferiores, que só sabem oprimir e ser …parvos.
Talvez seja das alterações climáticas, os defeitos das mulheres não só desapareceram, como se alteraram, passando a ser virtudes. À mulher intratável, chamamos de espirituosa. À mulher sociopata, chamamos de competitiva. Toda uma novilíngua que visa esbater a fronteira do reprovável, de modo a retirar toda e qualquer responsabilidade de o ser não portador de pénis poder ser avaliado com um ser humano sofrível.
A coisa está tão deliciosa, que qualquer nota sobre o facto de que o não portador de pénis ser humano e padecendo dos mesmos defeitos de carácter que os demais, é considerado de ódio contra as mulheres.
Quem controla o discurso, controla o pensamento, e o discurso comercial publicitário, é uma forma de controlo de linguagem e de ideias. Ajuda a criar um ambiente social, que transfere para os indivíduos um sistema de valores.
III
No anúncio sobre a televisão smart, o actor representa o arquétipo do homem retratado pela propaganda nos últimos 25 anos.
Parvo, panhonha, apalhaçado, boçal e limitado intelectualmente.
Ela, sabida, esperta, vivaça, conhecedora, competente, independente e bastião de autoridade.
Ambos de pele clara, olhos claros, e cabelos louros ou aloirados. O padrão nórdico, portanto, a servir de padrão num país mediterrânico, racialmente complexado.
O perfeito casal ariano moderno, exemplar da maioria da população portuguesa, que só ainda não emigrou para a Argentina en masse porque Portugal está na moda e gostamos dos chouriços e queijos daqui.
Relembro que um anúncio publicitário, só é eficaz na medida em que se servir do modus operandi mefistofélico, isto é, o seu maior truque é convencer sem deixar perceber que é convencimento, convencer que é só uma rábula engraçada, um episódio de humor anestesiante sem outro motivo que não informar para um produto ou funcionalidade. Sem qualquer carga ideológica implícita.
E isto apesar de ser feito por um batalhão de pessoas que estudaram ciências do convencimento, desde a Psicologia à construção civil, escalpelizando os medos, receios, ansiedades, complexos e aspirações do cidadão médio, para melhor o manipular, ou convencer a adquirir produtos.
Por isso, a projecção contínua de querubins nórdicos, e de homens imbecis não pode nem deve ser tomada como inócua de intenção.
O tipo do anúncio é um básico, uma ideia feita, um pré conceito, em que o homem é simples e simplório, que só concebe que uma televisão smart sirva para assar bifanas, ou para jogar um jogo com um disco e duas balizas.
Boa parte dos homens identifica-se com este arquétipo projectado, gostam de se pensar como simplórios, tal como o discurso feminista os retrata. Quase que agradecendo por existir e pelo potencial favor erótico que pode avir da sua complacência. Acreditam que é assim que se joga o jogo, até porque nunca exercitaram muito a espinal medula, e, portanto, é difícil de a manter…erecta.
Interiorizaram a alegada opressão passada aos não portadores de pénis, e tomam-na como sua responsabilidade.
Riem com a figura do ‘bócó’ do anúncio, que com o seu limitado limiar de concentração, delira com imbecilidades à primeira questão colocada pela interlocutora. Há uma espécie de regozijo com esta simplificação, talvez por os fazer sentir mais próximos do retrato do homem bruto de cavernas idas, expurgado hodiernamente destas sociedades polidas.
No segundo anúncio, da ‘netflick’, a cabeça do homem aparece como lugar de descanso dos pés da fêmea enfadada com um serão burguês, restrito à televisão normal.
O que devemos perguntar não é qual seria a nossa reacção se fosse um portador de pénis a repousar os pés na cabeça de um não portador de pénis, mas porque é que achamos isto como algo passível de ser engraçado.
Tal como devemos perguntar, se no anúncio da tv smart, não estamos sobre um exemplo de ‘womansplaining’ glorificado, onde a coerência lógica para uma ideia de igualdade estrita, se perde sobre uns esgares a que chamamos ‘sorrisos’.
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