IV
Também supostamente à esquerda, seja caviar, ou a ovas de carapau, encontramos a celebridade mediática Joana Amaral Dias.
Na altura em que este texto foi escrito tinha acabado de sair aquilo que segundo a visada foi um chamar de atenção à hipocrisia mediática, em forma de foto nua, com o rapaz por trás, e grávida de uma criança.
Num primeiro tempo chamou-lhe homenagem à gravidez e à mulher. Como um motivo só não chega, vai de expor a hipocrisia dos media.
Entretanto já correram rios de tinta sobre o assunto, que disputou brevemente, a atenção ao preso 33.
Quer-se lá saber das próximas eleições, já todos assumimos que nada vai mudar.
Rios de tinta correram, alguns mais perspicazes que este.
Mercê de uma beleza assinalável, devida aos cabelos louros e sorriso fácil quando não defende a feminilidade dos cidadãos, a senhora Joana Dias embarcou na aventura do Bloco de Esquerda desde a sua fundação, e desde a mesma foi deputada precoce, assinalável pelo tom colorido que colocou em bancadas pejadas de fatos de fazenda cinzenta e azul.
Anos mais tarde militaria nas fileiras presidenciais do senhor Mário Soares, esse revolucionário de esquerda que adoptou inúmeras ideias bloquistas.
Parece que também foi a forma encontrada por esta psicóloga para dar uma pedrada no charco, ter a coragem de fazer algo de diferente, marcar a sua qualidade de mulher, denunciar hipocrisias, ao serviço do mais antigo político em exercício, responsável por políticas progressistas de gaveta.
Ah mulher de têmpera, amazona da coerência!
Tal não foram as ondas de choque provocadas pela sua presença na bafienta política portuguesa, que foram movidas campanhas contra si, a mais célebre, aquela que dava conta de ser proprietária de um veículo de marca Mercedes-Benz e de modelo CLK, uma bomba na altura, e com o qual se deslocaria para o Parlamento não abdicando do subsídio para o passe social dado aos deputados.
Cedo esclareceu esta campanha caluniosa movida por forças obscuras ameaçadas pelo seu brilhantismo.
Ao longo dos anos as suas intervenções mais acaloradas, prenderam-se com os direitos femininos, baseados no argumento recorrente de que tinha de haver acesso e liberdade para melhores condições retributivas para as mulheres, a par dos homens, pois mais mulheres acabavam os cursos nas universidades, e com melhores notas.
Nunca se dignou a explicar o porquê dos homens serem burros ou madraços, nem de clarificar as estatísticas onde se baseava, como professora de Psicologia, nunca foi muito de frequentar universidades de Engenharia.
Confesso que nunca entendi esta concepção de igualdade, uma vez que é estabelecida uma meritocracia baseada na realização académica.
O que significa que a desigualdade salarial é tão inevitável como desejada entre profissões, como entre géneros, especialmente se o género feminino tiver mais 'cabeça' para a 'escola'.
Parece portanto que o mérito académico está irrevogavelmente associado à competência em todos os aspectos da vida laboral, e que por isso os burros ou os mamões devem ter um ordenado digno, mas inferior aos que foram alunos de excelência.
O que é sinistro para quem enverga a máscara de ser de esquerda.
O anti aristotelismo da senhora Joana Amaral Dias sempre a levou a combater vigorosamente todos os estereótipos associados à mulher mesmo alienando metade do eleitorado, o eleitorado masculino.
Boa parte deste eleitorado, efeminado por campanhas de marketing publicitário que cada vez mais se baseiam na flagelação do masculino, aceita bem a Joana Amaral Dias que conhecemos, porque é uma cara bonita aliada a uma inteligência combativa, que faz perdoar todas as diferenças ideológicas que se possam interpor. E por isso nem se considera desconsiderado com as intervenções da frontal Joana Dias, quer porque interiorizou esse cilício interior de que tudo o que é masculino não tem beleza, quer porque é de homem flagelar-se no altar da deusa.
Afinal, homem que não gosta de qualquer mulher não é homem, já o profetizava José Rodrigues dos Santos com as suas carinhas marotas esgalhadas no final do Telejornal quando era moda acabar o mesmo, sempre com passagem de modelos.
A convicção profunda, aliada à sede de protagonismo, não permitem qualquer leitura de hipocrisia no comportamento da senhora Joana Amaral Dias.
Ela acredita mesmo na imagem que acha que projecta. É essa a sua máscara.
Tem de acreditar. Construir mundos nos quais o ego sai sempre à melhor luz, é o trabalho fotográfico que o próprio ego tem de fazer em qualquer pessoa, como forma de sobrevivência, como mecanismo filogenético, que levado ao extremo se designa de mitomania, mas nada como Joana Dias para o esclarecer, em virtude da sua formação.
A Joana, acha que posando nua para uma revista cor-de-rosa, provoca um debate sobre os 'direitos da parentalidade, da maternidade' tão atacados nos dias que correm. Não que Joana Dias não tenha razão. Ao longo do tempo tem quase sempre tido, mas isso também se pode dizer de qualquer demagogo.
A demagogia tem sempre razão. O crime do demagogo é usar a verdade coeva em seu benefício, o castigo é perder a credibilidade, 'ah, é demagogo'.
Joana sabe isto, é autora até de um livro sobre o que os políticos têm na cabeça.
Joana não cometeu nenhum crime, de facto, apenas de gosto. Escarrapachou o mau gosto, aliado ao pudor que ainda temos de misturar política com coisas comezinhas. O problema não foi posar descascada. Foi querer seriedade depois de posar descascada. E foi por antes, ter exigido seriedade aos outros. Mas nós, opinião pública, castigamos Joana pela sua adesão às doutrinas de São Tomás?
Não. O camarada Relvas, teve a audácia a que nos acostumou, de voltar a aparecer no pequeno ecrã, desta feita para comentar o indigente debate do seu amigalhaço primeiro-ministro. Menos vergonha teve a estação televisiva que pagou o favor colocando-o no ar.
Não faço aqui uma comparação entre ambos, minha rica Joana, apesar de tudo.
Ambos padecem das fraquezas do ego. Relvas não acredita no que diz - é apenas um meio - e a vox populi sabe-o.
A vox populi tinha a esperança que Joana acreditasse no que dizia.
O senhor Relvas é um 'empreendedor', e a malta sabe e aceita.
A Joana tinha a pretensão de seriedade e do hastear da bandeira dos fracos e oprimidos.
A malta acredita mais na malandragem da equivalência académica e do turbo-deputado, que na filantropia desinteressada.
Foi isto que a professora universitária não percebeu.
Para os verdadeiramente interessados no bem comum, quiçá os de esquerda, o parecer é tão ou mais importante que o ser.
A utilização da sua imagem, mesmo que além de uma vaidadezinha ou busca de atenção à la miss esquecida pelos holofotes mediáticos, é o que a malta não lhe perdoa.
Uns sabiam que a manipulação da verdade, isto é, a demagogia, era só fumo. Outros acreditavam mesmo em Joana.
Esses são os que mais a criticam agora que deu o passo para as páginas centrais de uma revista sem conteúdo.
Que um jogador de futebol faça isso, que um cantor coloque um disco à frente dos seus países baixos, ninguém critica.
Que a Joana, ex deputada arauta dos fracos e espoliados, o faça, lança a sombra sobre as suas intenções.
Queixa-se nas redes sociais (onde os séquitos criam ambientes propícios para mais manifestações de egos magoados, ou nos jornais que procuram sempre a nova polémica) que o que fez foi para chamar a atenção para o conteúdo político das propostas do partido onde agora milita e que ajudou a fundar, esquecido pelos debates com impacto mediático forjados pelas estações televisivas que formam os elegíveis e desde sempre cilindram as forças políticas menores.
Como se no tempo que leva de política Joana não soubesse que é assim a 3ª República.
Além de que, não me lembro de a ter visto descascada em idade mais recuada, logo mais a jeito de atitudes acaloradas, quando puxava pelo Bloco de Esquerda.
Como uma desculpa não chega, criticou os media e a opinião pública por causa de não prestarem atenção ao que publica como académica, mas que se aparecer desnuda não se calam com isso.
Que o seu corpo sem roupa, que a derme à luz do calor do estúdio fotográfico, são os instrumentos para denunciar a hipocrisia que ainda grassa na sociedade burguesa portuguesa.
Que a foto estilizada sem Photoshop, que a foto 'just Joana + partenaire' serve também para denunciar o direito à maternidade, à paternidade no sentido de direitos laborais atacados pela desregulamentação levada a cabo por este executivo governativo, que faz com que as pessoas não tenham filhos, que as mulheres apertem as mamas para ver se sai leite para provarem que estão grávidas, ou que andem sempre com o credo no coração pois uma gestação é quase sempre sinónimo de despedimento, e Joana mais uma vez tem razão.
Mas não podemos deixar de nos perguntar, qual o elemento em comum, além da genialidade desta académica, para três razões díspares de denúncia, coincidirem nas fotos do corpo nu de Joana.
Como é que o corpo nu de Joana denuncia ao mesmo tempo a hipocrisia de uma sociedade medíocre e mediática, de uma sociedade suicida demograficamente e de desregulamentação laboral, e de uma sociedade que presta pouca atenção aos académicos e ao que produzem, a não ser para escarrapachar os títulos nos folhetos de propaganda política ou nos jornais como forma de garantir seriedade e atestar competências?
Este, pelo menos 3 em 1, parece o que é, uma desculpa.
A nudez da honestidade, ou a honestidade da nudez teria sido verdadeira se Joana tivesse admitido que estava com saudades de ter as atenções para si voltadas. Que um ego insuflado exige alimento constante.
Joana parece portanto não servir a verdade, mas servir-se dela, não o admitindo. É esse o pecado de Joana Amaral Dias.
O amor ao próximo e a uma sociedade mais justa, parecem ser portanto, não as raízes da sua acção política, mas os meios de colmatar outro tipo de fome.
A verdade é revolucionária, e nem sempre a verdade é a nudez. Neste caso a nudez cobre a mentira.
Pondo de lado estas considerações só resta fazer uma exigência à classe média da boa consciência, bem como um lamento.
A representação da República portuguesa deve ser alterada, o modelo das futuras estátuas de peito desnudo, devem ser feitas a partir de Joana Dias como modelo desses mármores do futuro.
Ela pode aparecer assim como a representação da pureza do nosso regime político, na forma aligeirada de vestes que desde sempre revestiu a propaganda republicana.
Temos de lamentar, que o corpo do cidadão anónimo não tenha igualdade de impacto circunstancial, como o corpo de mulher bonita e inteligente. Embora a inteligência não seja visível na nudez.
Além de anónimos, temos de nos contentar, com a total indigência de poder revolucionário.
Se o tivéssemos, podíamos acompanhar Joana na sua cruzada, e Portugal seria um país mais justo só porque passaríamos o tempo a gastar a pasta de papel obtida nos incêndios de Verão, em revistas panfletárias cujo o único conteúdo seriam fotos dos nossos corpos nus.
Quem é Joana Amaral Dias?
É uma política, professora universitária e activista portuguesa. E é bonita. Mas isso é o que menos interessa, tal como estar grávida. Ser bonita é relativo, estar grávida é uma questão pessoal, aparentemente recorrente no género feminino, e felizmente, comum.
Foi convidada para posar nua na revista 'Cristina' por ser professora universitária?
Não creio, não é habitual ver professoras universitárias descascadas nas revistas portuguesas, embora esteja aberto o precedente.
Tivemos uma professora do secundário, em Mirandela a presentear a beleza das suas carnes ao olhar público, mas é sinal de progresso o aumentar do grau académico dos nudistas, acompanhando o espírito dos tempos, antigamente também exportávamos trolhas para a emigração e agora exportamos médicos e engenheiros.
Também não foi por estar grávida que a convidaram, por certo. Existe muita grávida que facilmente faria o mesmo trabalho de pose, se obtivesse convite. Felizmente a gravidez, embora não nos números desejáveis para um país à beira da extinção, é algo de comum.
Infelizmente nem todas as grávidas posam para revistas.
Parece portanto, que o critério foi a notoriedade.
Porque é que uma Maria de Lurdes Pintassilgo, Odete Santos ou Maria Helena Rocha Pereira não posaram nuas em revistas?
Dirá o pedante, que se calhar não foram convidadas, dirá o perspicaz que se calhar foi porque defendiam a rejeição completa dos lugares comuns em relação à mulher, incluindo a reificação do seu corpo. Mesmo que para supostamente 'defender' um direito à maternidade e ao corpo.
Para Joana não. O estilo, ou gosto é diferente.
Tal como se encontra na festa do Avante, uma ou outra banca de fast food imperialista, na tal lógica de que destruímos o sistema com os trocos do sistema, denuncia-se a hipocrisia do sistema com a hipocrisia do sistema.
Oh sistema que reificas as mulheres, toma lá nas trombas as fotos que denunciam a tua reificação.
Joana foi convidada para posar por ser bonita?
Não só. A beleza, felizmente é tão relativa como vulgar.
Se todas as mulheres bonitas portuguesas fossem convidadas a posar nuas, Portugal passaria a ser um dos maiores importadores de pasta de papel do mundo.
Joana foi convidada a posar nua porque ninguém estava à espera que o fizesse.
Se a concorrente de um qualquer reality show aparecesse desnuda, tal seria normalíssimo e esperado, exigível até. Nem provocaria muita curiosidade tal a normalidade com que acontece.
Joana foi convidada porque teve um papel político e mediático, que contrasta, ainda que minimamente com o papel desempenhado num reality show. E por isso ninguém estava à espera o que só aumenta o apetite e impacto do acto de posar. Afinal, 'Cristina' é feita para as vendas.
Joana é convidada porque tinha hype.
O mediatismo é algo que é dado, raramente conquistado.
O relevo político é algo que é conquistado e raramente dado.
Foi a síntese perfeita destes dois factores que brindou a nação portuguesa com a longamente aguardada exposição da intimidade corporal de Joana Dias.
A osmose entre mediatismo e papel político é tal hoje, que não há uma distinção clara entre os dois.
Joana sabe-o. E usa isso a seu favor.
Mas nem por isso desejamos o despir de pudores de personagens truculentas como o senhor Pires de Lima ou o senhor Jorge Coelho, ao lado do senhor Ricardo Quaresma na sua luta cívica pela nudez.
Louvada nas redes sociais, Joana aparece como a heroína da vida privada travestida de questão 'fracturante'.
Aquela que mostra a sua faceta humana além da política, dona do seu corpo enquanto visto por outros, exactamente porque não é uma como as outras, foi feita pelo mecanismo mediático, e pôs-se sempre a jeito disso, alinhando sempre em quase todas as solicitações feitas para diferentes formatos mediáticos.
Mas nunca foi a única a fazê-lo. Se não se critica um político por pertencer a uma direcção de clube de futebol, porque se haverá de criticar uma política de aparecer numa revista de acontecimentos?
A separação dos papeis, é contudo, vista assim, com preocupação. Joana ao desnudar-se cumpriu o mais salazarento cliché, que provavelmente nem a Salazar lembraria.
Daqui para a frente é claro que o tempo de antena de Joana não decorre pelo seu labor político concreto, que o tem, com mérito. Decorre pela sua imagem, ah aquela que apareceu nua, a denunciar não sei o quê e que dá, literalmente, o corpo às balas, perdão, às objectivas.
A ironia reside no carácter pioneiro e inconsciente por parte da personalidade política de Joana Dias.
Se antes, o corpo feminino aparecia em tudo o que era folheto comercial, de berbequins a desodorizantes, de bolachas de cereais a rebuçados, depois de Joana, o corpo feminino serve também para vender mediatismo político.
Político? Politiqueiro.
O simples escrutínio da forma e do conteúdo do comportamento da activista em questão só pode reforçar a ideia de utilização do binómio mediatismo/poder político. O peso político dependendo da visibilidade, e a visibilidade dependendo do peso político explicam cabalmente as razões de Joana.
De todo, não querendo comparar, nem sendo comparável, há contudo que lembrar o caso de uma parlamentar italiana de nome Cicciolina. Acusada de tiques de vedetismo primário, e de contribuir para a redução do prestígio da política do seu país, também Cicciolina se fez arauta da liberdade sexual das suas conterrâneas, dando também ela o corpo ao manifesto.
Na História que se repete como farsa, Joana a esta luz, é mais um prego no caixão da ideia que o destino da mulher não é o seu corpo.
Num aparente golpe de rins em relação à reacção provocada por suas carnes brancas expostas na comunicação social, nas redes sociais e em alguns jornais Joana Amaral Dias insiste no argumento da denúncia da hipocrisia como móbil da sua acção. Como soa bem e de desculpa serve, volta a posar nua, e a utilizar a sua filha por nascer como expressão da sua adesão a um ideal, ou uma denúncia.
Como deve ser lida esta suposta irreverência?
Como a instrumentalização do seu corpo, com a instrumentalização da sua prole, com a instrumentalização do seu sexo.
Joana Amaral Dias, talvez surpresa pelo impacto que teve mediaticamente, que sempre buscou (mas não em doses de cavalo que a erotização de um corpo nu em revista permite), operou uma fuga para a frente.
Politizou o seu corpo, se acreditarmos na sua desculpa, politizou o seu sexo, politizou a sua gravidez, ou seja, politizou publicamente a intimidade que diz defender com o corpo nu.
A politização como forma de ter protagonismo. É a própria Joana que o diz quando se queixa de ter pouca atenção mediática.
Assim se reificam as convicções, se elas não eram já máscaras.
A Joana Amaral Dias nua?
A Joana Amaral Dias grávida?
Esta raríssima combinação de estados confundiu todos os aristotélicos.
Também supostamente à esquerda, seja caviar, ou a ovas de carapau, encontramos a celebridade mediática Joana Amaral Dias.
Na altura em que este texto foi escrito tinha acabado de sair aquilo que segundo a visada foi um chamar de atenção à hipocrisia mediática, em forma de foto nua, com o rapaz por trás, e grávida de uma criança.
Num primeiro tempo chamou-lhe homenagem à gravidez e à mulher. Como um motivo só não chega, vai de expor a hipocrisia dos media.
Entretanto já correram rios de tinta sobre o assunto, que disputou brevemente, a atenção ao preso 33.
Quer-se lá saber das próximas eleições, já todos assumimos que nada vai mudar.
Rios de tinta correram, alguns mais perspicazes que este.
Mercê de uma beleza assinalável, devida aos cabelos louros e sorriso fácil quando não defende a feminilidade dos cidadãos, a senhora Joana Dias embarcou na aventura do Bloco de Esquerda desde a sua fundação, e desde a mesma foi deputada precoce, assinalável pelo tom colorido que colocou em bancadas pejadas de fatos de fazenda cinzenta e azul.
Anos mais tarde militaria nas fileiras presidenciais do senhor Mário Soares, esse revolucionário de esquerda que adoptou inúmeras ideias bloquistas.
Parece que também foi a forma encontrada por esta psicóloga para dar uma pedrada no charco, ter a coragem de fazer algo de diferente, marcar a sua qualidade de mulher, denunciar hipocrisias, ao serviço do mais antigo político em exercício, responsável por políticas progressistas de gaveta.
Ah mulher de têmpera, amazona da coerência!
Tal não foram as ondas de choque provocadas pela sua presença na bafienta política portuguesa, que foram movidas campanhas contra si, a mais célebre, aquela que dava conta de ser proprietária de um veículo de marca Mercedes-Benz e de modelo CLK, uma bomba na altura, e com o qual se deslocaria para o Parlamento não abdicando do subsídio para o passe social dado aos deputados.
Cedo esclareceu esta campanha caluniosa movida por forças obscuras ameaçadas pelo seu brilhantismo.
Ao longo dos anos as suas intervenções mais acaloradas, prenderam-se com os direitos femininos, baseados no argumento recorrente de que tinha de haver acesso e liberdade para melhores condições retributivas para as mulheres, a par dos homens, pois mais mulheres acabavam os cursos nas universidades, e com melhores notas.
Nunca se dignou a explicar o porquê dos homens serem burros ou madraços, nem de clarificar as estatísticas onde se baseava, como professora de Psicologia, nunca foi muito de frequentar universidades de Engenharia.
Confesso que nunca entendi esta concepção de igualdade, uma vez que é estabelecida uma meritocracia baseada na realização académica.
O que significa que a desigualdade salarial é tão inevitável como desejada entre profissões, como entre géneros, especialmente se o género feminino tiver mais 'cabeça' para a 'escola'.
Parece portanto que o mérito académico está irrevogavelmente associado à competência em todos os aspectos da vida laboral, e que por isso os burros ou os mamões devem ter um ordenado digno, mas inferior aos que foram alunos de excelência.
O que é sinistro para quem enverga a máscara de ser de esquerda.
O anti aristotelismo da senhora Joana Amaral Dias sempre a levou a combater vigorosamente todos os estereótipos associados à mulher mesmo alienando metade do eleitorado, o eleitorado masculino.
Boa parte deste eleitorado, efeminado por campanhas de marketing publicitário que cada vez mais se baseiam na flagelação do masculino, aceita bem a Joana Amaral Dias que conhecemos, porque é uma cara bonita aliada a uma inteligência combativa, que faz perdoar todas as diferenças ideológicas que se possam interpor. E por isso nem se considera desconsiderado com as intervenções da frontal Joana Dias, quer porque interiorizou esse cilício interior de que tudo o que é masculino não tem beleza, quer porque é de homem flagelar-se no altar da deusa.
Afinal, homem que não gosta de qualquer mulher não é homem, já o profetizava José Rodrigues dos Santos com as suas carinhas marotas esgalhadas no final do Telejornal quando era moda acabar o mesmo, sempre com passagem de modelos.
A convicção profunda, aliada à sede de protagonismo, não permitem qualquer leitura de hipocrisia no comportamento da senhora Joana Amaral Dias.
Ela acredita mesmo na imagem que acha que projecta. É essa a sua máscara.
Tem de acreditar. Construir mundos nos quais o ego sai sempre à melhor luz, é o trabalho fotográfico que o próprio ego tem de fazer em qualquer pessoa, como forma de sobrevivência, como mecanismo filogenético, que levado ao extremo se designa de mitomania, mas nada como Joana Dias para o esclarecer, em virtude da sua formação.
A Joana, acha que posando nua para uma revista cor-de-rosa, provoca um debate sobre os 'direitos da parentalidade, da maternidade' tão atacados nos dias que correm. Não que Joana Dias não tenha razão. Ao longo do tempo tem quase sempre tido, mas isso também se pode dizer de qualquer demagogo.
A demagogia tem sempre razão. O crime do demagogo é usar a verdade coeva em seu benefício, o castigo é perder a credibilidade, 'ah, é demagogo'.
Joana sabe isto, é autora até de um livro sobre o que os políticos têm na cabeça.
Joana não cometeu nenhum crime, de facto, apenas de gosto. Escarrapachou o mau gosto, aliado ao pudor que ainda temos de misturar política com coisas comezinhas. O problema não foi posar descascada. Foi querer seriedade depois de posar descascada. E foi por antes, ter exigido seriedade aos outros. Mas nós, opinião pública, castigamos Joana pela sua adesão às doutrinas de São Tomás?
Não. O camarada Relvas, teve a audácia a que nos acostumou, de voltar a aparecer no pequeno ecrã, desta feita para comentar o indigente debate do seu amigalhaço primeiro-ministro. Menos vergonha teve a estação televisiva que pagou o favor colocando-o no ar.
Não faço aqui uma comparação entre ambos, minha rica Joana, apesar de tudo.
Ambos padecem das fraquezas do ego. Relvas não acredita no que diz - é apenas um meio - e a vox populi sabe-o.
A vox populi tinha a esperança que Joana acreditasse no que dizia.
O senhor Relvas é um 'empreendedor', e a malta sabe e aceita.
A Joana tinha a pretensão de seriedade e do hastear da bandeira dos fracos e oprimidos.
A malta acredita mais na malandragem da equivalência académica e do turbo-deputado, que na filantropia desinteressada.
Foi isto que a professora universitária não percebeu.
Para os verdadeiramente interessados no bem comum, quiçá os de esquerda, o parecer é tão ou mais importante que o ser.
A utilização da sua imagem, mesmo que além de uma vaidadezinha ou busca de atenção à la miss esquecida pelos holofotes mediáticos, é o que a malta não lhe perdoa.
Uns sabiam que a manipulação da verdade, isto é, a demagogia, era só fumo. Outros acreditavam mesmo em Joana.
Esses são os que mais a criticam agora que deu o passo para as páginas centrais de uma revista sem conteúdo.
Que um jogador de futebol faça isso, que um cantor coloque um disco à frente dos seus países baixos, ninguém critica.
Que a Joana, ex deputada arauta dos fracos e espoliados, o faça, lança a sombra sobre as suas intenções.
Queixa-se nas redes sociais (onde os séquitos criam ambientes propícios para mais manifestações de egos magoados, ou nos jornais que procuram sempre a nova polémica) que o que fez foi para chamar a atenção para o conteúdo político das propostas do partido onde agora milita e que ajudou a fundar, esquecido pelos debates com impacto mediático forjados pelas estações televisivas que formam os elegíveis e desde sempre cilindram as forças políticas menores.
Como se no tempo que leva de política Joana não soubesse que é assim a 3ª República.
Além de que, não me lembro de a ter visto descascada em idade mais recuada, logo mais a jeito de atitudes acaloradas, quando puxava pelo Bloco de Esquerda.
Como uma desculpa não chega, criticou os media e a opinião pública por causa de não prestarem atenção ao que publica como académica, mas que se aparecer desnuda não se calam com isso.
Que o seu corpo sem roupa, que a derme à luz do calor do estúdio fotográfico, são os instrumentos para denunciar a hipocrisia que ainda grassa na sociedade burguesa portuguesa.
Que a foto estilizada sem Photoshop, que a foto 'just Joana + partenaire' serve também para denunciar o direito à maternidade, à paternidade no sentido de direitos laborais atacados pela desregulamentação levada a cabo por este executivo governativo, que faz com que as pessoas não tenham filhos, que as mulheres apertem as mamas para ver se sai leite para provarem que estão grávidas, ou que andem sempre com o credo no coração pois uma gestação é quase sempre sinónimo de despedimento, e Joana mais uma vez tem razão.
Mas não podemos deixar de nos perguntar, qual o elemento em comum, além da genialidade desta académica, para três razões díspares de denúncia, coincidirem nas fotos do corpo nu de Joana.
Como é que o corpo nu de Joana denuncia ao mesmo tempo a hipocrisia de uma sociedade medíocre e mediática, de uma sociedade suicida demograficamente e de desregulamentação laboral, e de uma sociedade que presta pouca atenção aos académicos e ao que produzem, a não ser para escarrapachar os títulos nos folhetos de propaganda política ou nos jornais como forma de garantir seriedade e atestar competências?
Este, pelo menos 3 em 1, parece o que é, uma desculpa.
A nudez da honestidade, ou a honestidade da nudez teria sido verdadeira se Joana tivesse admitido que estava com saudades de ter as atenções para si voltadas. Que um ego insuflado exige alimento constante.
Joana parece portanto não servir a verdade, mas servir-se dela, não o admitindo. É esse o pecado de Joana Amaral Dias.
O amor ao próximo e a uma sociedade mais justa, parecem ser portanto, não as raízes da sua acção política, mas os meios de colmatar outro tipo de fome.
A verdade é revolucionária, e nem sempre a verdade é a nudez. Neste caso a nudez cobre a mentira.
Pondo de lado estas considerações só resta fazer uma exigência à classe média da boa consciência, bem como um lamento.
A representação da República portuguesa deve ser alterada, o modelo das futuras estátuas de peito desnudo, devem ser feitas a partir de Joana Dias como modelo desses mármores do futuro.
Ela pode aparecer assim como a representação da pureza do nosso regime político, na forma aligeirada de vestes que desde sempre revestiu a propaganda republicana.
Temos de lamentar, que o corpo do cidadão anónimo não tenha igualdade de impacto circunstancial, como o corpo de mulher bonita e inteligente. Embora a inteligência não seja visível na nudez.
Além de anónimos, temos de nos contentar, com a total indigência de poder revolucionário.
Se o tivéssemos, podíamos acompanhar Joana na sua cruzada, e Portugal seria um país mais justo só porque passaríamos o tempo a gastar a pasta de papel obtida nos incêndios de Verão, em revistas panfletárias cujo o único conteúdo seriam fotos dos nossos corpos nus.
Quem é Joana Amaral Dias?
É uma política, professora universitária e activista portuguesa. E é bonita. Mas isso é o que menos interessa, tal como estar grávida. Ser bonita é relativo, estar grávida é uma questão pessoal, aparentemente recorrente no género feminino, e felizmente, comum.
Foi convidada para posar nua na revista 'Cristina' por ser professora universitária?
Não creio, não é habitual ver professoras universitárias descascadas nas revistas portuguesas, embora esteja aberto o precedente.
Tivemos uma professora do secundário, em Mirandela a presentear a beleza das suas carnes ao olhar público, mas é sinal de progresso o aumentar do grau académico dos nudistas, acompanhando o espírito dos tempos, antigamente também exportávamos trolhas para a emigração e agora exportamos médicos e engenheiros.
Também não foi por estar grávida que a convidaram, por certo. Existe muita grávida que facilmente faria o mesmo trabalho de pose, se obtivesse convite. Felizmente a gravidez, embora não nos números desejáveis para um país à beira da extinção, é algo de comum.
Infelizmente nem todas as grávidas posam para revistas.
Parece portanto, que o critério foi a notoriedade.
Porque é que uma Maria de Lurdes Pintassilgo, Odete Santos ou Maria Helena Rocha Pereira não posaram nuas em revistas?
Dirá o pedante, que se calhar não foram convidadas, dirá o perspicaz que se calhar foi porque defendiam a rejeição completa dos lugares comuns em relação à mulher, incluindo a reificação do seu corpo. Mesmo que para supostamente 'defender' um direito à maternidade e ao corpo.
Para Joana não. O estilo, ou gosto é diferente.
Tal como se encontra na festa do Avante, uma ou outra banca de fast food imperialista, na tal lógica de que destruímos o sistema com os trocos do sistema, denuncia-se a hipocrisia do sistema com a hipocrisia do sistema.
Oh sistema que reificas as mulheres, toma lá nas trombas as fotos que denunciam a tua reificação.
Joana foi convidada para posar por ser bonita?
Não só. A beleza, felizmente é tão relativa como vulgar.
Se todas as mulheres bonitas portuguesas fossem convidadas a posar nuas, Portugal passaria a ser um dos maiores importadores de pasta de papel do mundo.
Joana foi convidada a posar nua porque ninguém estava à espera que o fizesse.
Se a concorrente de um qualquer reality show aparecesse desnuda, tal seria normalíssimo e esperado, exigível até. Nem provocaria muita curiosidade tal a normalidade com que acontece.
Joana foi convidada porque teve um papel político e mediático, que contrasta, ainda que minimamente com o papel desempenhado num reality show. E por isso ninguém estava à espera o que só aumenta o apetite e impacto do acto de posar. Afinal, 'Cristina' é feita para as vendas.
Joana é convidada porque tinha hype.
O mediatismo é algo que é dado, raramente conquistado.
O relevo político é algo que é conquistado e raramente dado.
Foi a síntese perfeita destes dois factores que brindou a nação portuguesa com a longamente aguardada exposição da intimidade corporal de Joana Dias.
A osmose entre mediatismo e papel político é tal hoje, que não há uma distinção clara entre os dois.
Joana sabe-o. E usa isso a seu favor.
Mas nem por isso desejamos o despir de pudores de personagens truculentas como o senhor Pires de Lima ou o senhor Jorge Coelho, ao lado do senhor Ricardo Quaresma na sua luta cívica pela nudez.
Louvada nas redes sociais, Joana aparece como a heroína da vida privada travestida de questão 'fracturante'.
Aquela que mostra a sua faceta humana além da política, dona do seu corpo enquanto visto por outros, exactamente porque não é uma como as outras, foi feita pelo mecanismo mediático, e pôs-se sempre a jeito disso, alinhando sempre em quase todas as solicitações feitas para diferentes formatos mediáticos.
Mas nunca foi a única a fazê-lo. Se não se critica um político por pertencer a uma direcção de clube de futebol, porque se haverá de criticar uma política de aparecer numa revista de acontecimentos?
A separação dos papeis, é contudo, vista assim, com preocupação. Joana ao desnudar-se cumpriu o mais salazarento cliché, que provavelmente nem a Salazar lembraria.
Daqui para a frente é claro que o tempo de antena de Joana não decorre pelo seu labor político concreto, que o tem, com mérito. Decorre pela sua imagem, ah aquela que apareceu nua, a denunciar não sei o quê e que dá, literalmente, o corpo às balas, perdão, às objectivas.
A ironia reside no carácter pioneiro e inconsciente por parte da personalidade política de Joana Dias.
Se antes, o corpo feminino aparecia em tudo o que era folheto comercial, de berbequins a desodorizantes, de bolachas de cereais a rebuçados, depois de Joana, o corpo feminino serve também para vender mediatismo político.
Político? Politiqueiro.
O simples escrutínio da forma e do conteúdo do comportamento da activista em questão só pode reforçar a ideia de utilização do binómio mediatismo/poder político. O peso político dependendo da visibilidade, e a visibilidade dependendo do peso político explicam cabalmente as razões de Joana.
De todo, não querendo comparar, nem sendo comparável, há contudo que lembrar o caso de uma parlamentar italiana de nome Cicciolina. Acusada de tiques de vedetismo primário, e de contribuir para a redução do prestígio da política do seu país, também Cicciolina se fez arauta da liberdade sexual das suas conterrâneas, dando também ela o corpo ao manifesto.
Na História que se repete como farsa, Joana a esta luz, é mais um prego no caixão da ideia que o destino da mulher não é o seu corpo.
Num aparente golpe de rins em relação à reacção provocada por suas carnes brancas expostas na comunicação social, nas redes sociais e em alguns jornais Joana Amaral Dias insiste no argumento da denúncia da hipocrisia como móbil da sua acção. Como soa bem e de desculpa serve, volta a posar nua, e a utilizar a sua filha por nascer como expressão da sua adesão a um ideal, ou uma denúncia.
Como deve ser lida esta suposta irreverência?
Como a instrumentalização do seu corpo, com a instrumentalização da sua prole, com a instrumentalização do seu sexo.
Joana Amaral Dias, talvez surpresa pelo impacto que teve mediaticamente, que sempre buscou (mas não em doses de cavalo que a erotização de um corpo nu em revista permite), operou uma fuga para a frente.
Politizou o seu corpo, se acreditarmos na sua desculpa, politizou o seu sexo, politizou a sua gravidez, ou seja, politizou publicamente a intimidade que diz defender com o corpo nu.
A politização como forma de ter protagonismo. É a própria Joana que o diz quando se queixa de ter pouca atenção mediática.
Assim se reificam as convicções, se elas não eram já máscaras.
A Joana Amaral Dias nua?
A Joana Amaral Dias grávida?
Esta raríssima combinação de estados confundiu todos os aristotélicos.