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Com Para São

2/20/2015

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Com:

 

Não sendo comparáveis, quer os contextos, quer as situações que originaram esses contextos, não deixa de ser curioso comparar dois comportamentos distintos entre o primeiro ministro português e o homólogo gaulês, Sr. Valls.

Desde logo e pelo conteúdo, sobre o possível abandono de cidadãos franceses de etnia/religião judaica (por causa de vandalização de cemitérios), o Sr. Valls manifesta-se contra, enunciando a nacionalidade francesa dos visados, tanto quanto assume que é responsabilidade do Estado garantir a segurança, neste e noutros exemplos.





Independentemente de pensarmos no interesse calculista que só uma má fé pode enunciar, como perda de capital cultural, técnico e financeiro com uma possível sangria, podemos ver claramente uma identificação entre a falência da República se não cria as condições básicas para a vida dos cidadãos.

 

Para o nosso Pedro Passos Coelho, doravante PPC, a miséria (neste caso não expressa em violência anti religiosa mas na mais óbvia indigência material) é uma oportunidade de emigrar, ir lá para fora onde são desenvolvidos, sair do país e de uma imaginária zona de conforto que o torrão pátrio parece fornecer a cerca de 300000 emigrados forçados, que expulsos desde o eclodir da crise constituem a maior vaga de emigração portuguesa, num país conhecido como sendo de emigrantes. PPC não só não se penitencia com a sua parte de responsabilidade, como se congratula com aquilo que parece assustar Valls, a falência de um projecto político comunitário e republicano, por causa de colocar em causa um Estado, declarando-o incapaz. A capacidade do Estado coelhista limita-se à economia e às finanças.,


 

Para PPC e seus acólitos, como Portas, emigração ou imigração são factores de consideração se gerarem dividendos, se os emigrantes enviarem remessas de dinheiro, ou se os imigrantes pagarem a bom preço vistos dourados, na maior prostituição da pátria, que podemos apontar na política dos últimos 40 anos.

 

Como Portas diz, fazendo uso e abuso de lugares comuns e populismo que não merecem reacção por causa da dormência causada pela sua repetição, a esquerda não presta para gerir dinheiro. Pois decorrendo desta análise, a direita não presta para gerir pessoas. Restaria esperar que cada emigrante fosse um maço de notas concreto e não divisa potencial pois nesse caso o nosso governo de direita porventura faria tudo para captar divisa, ao invés de a exortar a sair.

 

Toda esta megalomania, para não dizer incompetência, ou cagança mitómana aparece comprimida no discurso da ministra das finanças portuguesa quando afagada pelo Sr. Schaube solta o alivio orgulhoso de forma verbal repetindo que não somos a Grécia, ao invés somos um exemplo.

Este alinhar com o lado dos fortes, dos vencedores, dos senhores que dão o dinheirinho, e que nos ajudaram a concretizar o milagre do bom aluno, figura de estilo com raízes cavaquistas, é enternecedora.

Um país que expulsa 300 000 dos seus habitantes e que bate recordes naqueles que renunciam à sua nacionalidade, é um exemplo de quê?

 

O Sr. Valls preocupa-se com a saída do capital humano, PPC com a manutenção de uma imagem de respeitabilidade que lhe garanta crédito. França preocupa-se em continuar a ser um farol de esperança republicana, um exemplo para qualquer país em esforço democrático, em Portugal o único compromisso é o dos consecutivos pactos de regime, a que PPC chama de estabilidade política. De suma importância para a privatização da IIIa Republica e para os mercados.

Para:

O Sr. PPC nem se engasga com fatias de bolo rei. Prefere strudel embora não goste que lho digam.

Seus acólitos e apoiantes, que o colocaram no poder, glorificam-lhe a acção sob a presunção de que o cargo que exerce é muito exigente e que qualquer que seja a imbecilidade que o líder profira ou sustente, ela reflecte ou uma profunda e fatal sabedoria do líder, ou o mais perfeito conhecimento da realidade 'real'.

Mas é assim o espírito crítico da maior parte dos portugueses, preferem saber à boa maneira de uma novela, se o juiz da operação Marquês é mesmo filho de um carteiro, ou se o juiz do Processo Casa Pia fazia mesmo musculação. E ai de quem ataque o líder, o líder é sempre vítima de uma cabala.

É preferido repetir até à exaustão que o ministro grego das finanças é um borracho, que concretamente explicar o que propõe e no que se diferencia dos outros. Isso é acessório.

Para a maior parte dos eleitores que não partilha laços de sangue com os expatriados (e quando partilha a culpa afinal foi do governo anterior) o que é realmente dito por PPC é isto:

a)ao sugerir sair de Portugal, ou branqueando o estigma do desemprego, o que o nosso Primeiro faz é de facto incentivar ao empreendorismo (essa nova religião) e a uma rejeição cabal do choradinho tuga, traço de carácter que lembra a ataraxia com umas lágrimas à mistura;

b)expressão de maturidade e responsabilidade face à horrorosa situação que encontrou própria de um grande estadista que tenta insuflar confiança e extirpar o fatalismo e pessimismo, por mais que a realidade o contradiga, não fosse o facto de que é ele e os que pensam como ele que garantem a mais fidedigna versão dessa realidade;

c)é um esforço tecnofórmico de internacionalização de Portugal que o expatriado tem o dever de concretizar, levando daqui o servilismo e a mentalidade trabalhadeira que impressionam tanto lá fora os patrões como aqueles que afagam o pelo dos nosso respeitáveis representantes.

E ai daquele que é expulso que não se sinta honrado em ser a última e cabal exportação portuguesa.

 

 

É muito difícil acreditar que o outrora profissional da juventude partidária social democrática queira ver fora do país a mais formada geração que Portugal pariu, num claro esvaziamento de inteligência que de certeza lhe seria hostil em quase todos os pontos de vista.

 

O verdadeiro pacto de regime e drama nacional é este, é mais fácil expulsar a magotes, vastas franjas da população portuguesa, que alterar o que seja no sistema social classista e medieval das nossas castas. Completamente indiferente se em democracia ou ditadura, se exportando mão de obra barata ou pessoas com formação superior.

 

É bem mais provável, que o nosso Primeiro ainda ande perdido entre teorias macroeconómicas aprendidas tardiamente , e as poses que ensaia como o líder que ambiciona ser, em jeito análogo à adolescente que ensaia 'selfies'  frente ao espelho de forma a captar os melhores ângulos que lhe reforcem a auto imagem aprazível através das redes sociais.

 

A importância desta gente que tutela a coisa pública não reflecte a sua responsabilidade. De certa forma são inimputáveis. Por causa de quem neles vota, por causa do completo autismo, causado ou pela esperteza ou pelo provincianismo nato.

Esta esperteza e provincianismo são as palas nos olhos ou lentes através das quais interpretam a 'realidade' e são convictos defensores e defensoras destes viés, que lhes provam que os outros é que são enviesados.

O Sr. Silva, raramente se enganava e nunca cometia erros, criou escola nas juventudes partidárias, ou nas falanges uniformizadas do pensamento académico, nas classes sociais, ou nas profissões, de forma que é geral que quase ninguém se consiga colocar no lugar do outro.

 

 

 

A certeza própria cheia de si mesma, não precisa de mais nada. A populaça encara isto como a convicção, que aliada às promessas de cântico de sereia criam uma relação de má fé entre os políticos tornados raposas, e a população que sendo corvo com queijo no bico, lá se põe a trautear deixando cair o mesmo para o braço da raposa, que é percebida não como é mas como pitbull que zelará pelos interesses da populaça.

O pacto de regime é no fundo, uma relação calculista de má fé, onde cada elemento tenta tirar o melhor partido da situação, sem qualquer noção do que está a fazer.

Apenas sabemos que estamos bem e que é preciso continuar assim custe o que custar.

 

As nossas juventudes partidárias estão habituadas a negociar, não para chegar a terreno comum, mas apenas como forma de domar resistências que nem sequer merecem interiorização.

Os acólitos confundem isto como firmeza.

 Só assim se pode enquadrar o rol de desconsiderações relativo aos representantes gregos, e à Grécia como país, num triste cenário de miséria dado pelos tipos e tipas que são eleitos consecutivamente com um engrossar do partido da abstenção.

Não faz sentido que uma nação se queira livrar do ardil europeu, se esse ardil era deixá-la financeiramente dependente, então que pague primeiro antes de querer liberdade.

 

Portugal na figura dos seus eleitos, mostrou uma célebre política local, de freguesia versus câmara, na qual o asco existente para com a cor partidária antagónica faz depender o trabalho desempenhado. O ódio ideológico e programático resultante desta capacidade de compreensão é compensado por uma coluna vertebral espongiforme dançando ao sabor da brisa, martelando uma justificação estatística.

É muito fácil analisar números e dizer que se tem uma noção das dificuldades passadas pelos compatriotas.

 

São:

Num gabinete climatizado ou numa cantina de assembleia da República não serão regateados esforços de compreensão e de empatia crescente. Quer se trate de um tenro brigadeiro, quando se leem as estatísticas do desemprego, ou de um café com cheirinho de whisky velho quando se vê traduzido através de números a quantidade de gente que emigrou, ou que fica sem casa sem dinheiro para pagar ao banco.

 E a fúria privatizadora lava branco este falhanço da nossa democracia, pois não são imputadas culpas ao projecto político, mas sim, ao Estado enquanto construção teórica comunitária. Apresenta-se o Estado como um luxo que não deve lavar o rabinho a meninos, como algo que faz falta mas apenas residualmente, numa leitura muito longe da ideia de que eu abdico de parte dos meus rendimentos para ajudar outros e não apenas para pagar serviços.

 

Num bólide com estofos de cabedal pago por ordenados mínimos, pode o ministro e o secretário de estado dissertar sobre a sua capacidade empática de perceber a miséria que outros concidadãos passam, ora fugindo dos fiscais da água e da luz a quem não conseguem pagar, ora ranhosos e maltrapilhos esperando em urgências de hospital por algum qualquer serviço de saúde.

 

A miséria aparece assim como castigo às naturezas menores, mas o Estado tem como depósito de moralidade dos bons cidadãos, (aqueles que de boas famílias fazem isto andar para a frente), a obrigação de tornar menos óbvia esta indigência, mas só até certo ponto, pois não queremos cá lavar o rabinho a meninos, até porque não há dinheiro para isso, afinal os privados gerem cada vez melhor a coisa.

 

O argumento mais repetido nos corredores do parlamento é que os da oposição não conhecem a realidade, e com toda a razão pois não conhece ou reconhece a realidade quem não se questiona sobre ela.

Convicção que não se crítica a si mesma é dogma.

E os dogmas estão sempre do lado errado da História.

 

Portugal empobreceu como PPC desejava mas ainda não ao nível dos trabalhadores asiáticos da sweat shop que são quase monopolistas do mercado que a direita ambiciona.

O mercado esse Deus Ex Machina desta trupe.

 

O Sr. Coelho quer o que toda a gente quer, desafogo e prosperidade, num mundo alternativo e imaginário onde se enriquece empobrecendo e onde se melhora o ensino antagonizando os professores e manipulando a opinião pública a favor da proletarização dessa profissão, um pouco como foi feito aos polícias a canhão de àgua, ou a outras profissões no passado. Só ainda não se conseguiu fazer aos médicos, que pelo seu corporativismo bem o merecem, porque tendo 3 milhões de reformados é difícil manipular a opinião pública de que o tipo ou a tipa que lhes trata da saúde não merece ganhar bem.

 

Vamos ganhar esta luta pela mão de obra barata, a populações exponencialmente maiores que a nossa, apostando na qualidade das exportações de produtos avançados tecnologicamente, como figos cortiça e vinho.

Lentamente vamos aprendendo a viver cada vez menos com pouco, contribuindo para a alterância das zonas de miséria do mundo de acordo com os ciclos do capital.

 

O senhor primeiro ministro parece pois, querer indicar que se és português e queres ter uma vida condigna e ganhar um pouco mais, pira-te daqui para fora. Representa Portugal lá fora, porta-te bem e fala dos nossos vinhos, voa na TAP, e deposita o graveto nos nossos bancos.

Se ficas cá, ganhas o que te pagarem, dás o litro, e estrebuchas pouco, e de 4 em 4 anos legitimas a merda de regime que te devia orgulhar pela estabilidade e responsabilidade.

 

A memória do nosso povo é inversamente proporcional à sua paciência ovina, qualquer História de Portugal o revela.

 

Com governantes e governados assim, é preferível uma pátria à francesa, desde que não nos comparemos aos gregos.

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No olho da tempestade

10/10/2014

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O ano civil, que liturgicamente se inicia após o período de retemperadora exposição ao Sol na época balnear, parece que começou mal.

É sempre curioso observar o afã e a preocupação com que cada governo trata este assunto, independentemente do grau de competência.

Diz a boa consciência que talvez a preocupação com os alunos, supostamente o nosso futuro, seja o motivo desta preocupação. Mas, após análise mais atenta, temos de ceder a uma sombria constelação de dúvidas.

Desde a aglutinação em turmas sobrelotadas, passando pela incompreensível renovação e onerosidade dos manuais escolares, até à inadequação de planos curriculares e horários, podemos formular que se a preocupação dos governantes fosse os alunos ou as suas famílias, tem uma forma muito estranha de o demonstrar. O arranque do ano lectivo nada tem que ver com os alunos, mas sim com os pais, ou pelo menos determinado poder dos pais, além do económico.

Nesta democracia portuguesa quarentona, e em estranho contraponto com a ditadura que substituiu, fecham-se mais escolas que as naturalmente condenadas pela recessão demográfica.

Não é portanto qualquer coerência em manter uma consciência ingénua.

A preocupação todos os anos repetida no início do ano escolar tem apenas que ver com calculismo eleitoralista aplicado à opinião dos encarregados de educação, esses votantes burgueses, esses os verdadeiros preocupados, a par com os professores, com a educação e bem-estar dos alunos. A Educação Nacional torna-se assim em mais um objecto ao serviço das disputas políticas partidárias.

É para os pais que se desempenha a farsa eleitoralista, e retórica que faz emergir expressões como «Paixão pela educação» ou «exigência de rigor» e outras frases feitas que têm ajudado a criar as ideias feitas postas ao serviço da rotação partidária nesta «república».

Aos tutelares interessa capturar e manter o posto, e demonstrar perante os seus pares, s sua capacidade de efectuar e revolucionar deixando marca…Ou também lucrar com o empreendorismo obtido em anos de serviço público do qual a jusante se lucrará posteriormente por serviços feitos, colocando até o Estado a subsidiar escolas privadas.

Ao legislador interessa agradar a quem lhe paga, e o provincianismo acrítico torna-se escola de pensamento, sem qualquer estratégia nacional de longo prazo para a Educação, afinal único garante de saúde republicana. Vivemos de Setembro em Setembro, enquanto der dinheiro.

Quem são estes cúmplices domesticados e coniventes? O caro leitor deve ser um deles.

Estes cúmplices são a minoria de eleitores que de sufrágio em sufrágio ajuda a legitimar as «governações responsáveis» ou as «democracias maduras» daqueles que há 40 anos orbitam nos lugares de decisão.

Portugal é um país de castas, e a casta mais baixa é quase analfabeta, vê o ‘Secret Story’, usa penteado Tomahawk, e diz ‘Prontos’ quando perde a aposta no pittbull que na ilegalidade vê morrer numa qualquer luta de cães.

  A classe média é a classe quase inteiramente dedicada aos serviços, com ordenados baixos num contexto europeu, mas bem apetecível na realidade nacional, que pretende ter através de gadgets a riqueza material que a consagre cosmopolita como outras sociedades em que os ordenados mínimos superam 3 vezes o valor do nosso.

Estes salários de miséria, egrégios, permitem ainda assim alguma distinção social através dos já citados bens de prestígio, que não fariam sentido se não existisse a tal casta inferior a quem os mesmos estão inacessíveis ou limitados. É uma burguesia de verniz e bom-tom, que não deseja nenhum progresso social que não cosmético, inócuo e assexuado.

O progresso social desta gente gira em torno do seu umbigo, ou das suas curtas vistas em relação ao mundo, não deixam de ser analfabetos, mesmo que sejam detentores de títulos académicos, supostamente especializados numa área mas opinadores convictos e sapientes de todas. O conforto material sobrepõe-se a todos os outros, e a sua responsabilidade cívica reside nos documentos-indulgências que comprovam o pagamento de impostos bem como o voto sazonal para se manter a aparência de democracia, refém de quem com papas e bolos engana estes tolos.

É para esta gente que começam os anos lectivos. Os filhos são apenas a moeda de troca.

A degradação do ensino público e a sensibilidade que só uma carteira despreocupada permite leva a uma debandada para o ensino privado, para «dar melhores condições aos seus filhos» num mundo futuro de serviços e salários baixos, e que se lixem os outros nesta mundividência competitiva.

Deixá-los, eles podem pagar por estes favos de segurança e exclusividade. Para proteger os seus, ou se alienam mais da política, com a desilusão ou mesmo impotência, ou continuam a defender e a legitimar os que forçam a obliteração de um ensino gratuito e nacional, bem como as maiores esperanças de perpetuar o seu conforto material.

Votam e apoiam, sem preparação para tal senão a dos cursos que sobre alhos permitem opinar bugalhos, aqueles oráculos bípedes como o génio que surgiu com a ideia do turismo gerontófilo, isto é de construir hotéis de luxo com cuidados paliativos e de apoio aos reformados endinheirados da EU, enquanto os nossos continuam a morrer miseráveis e sós um pouco por todos os lares.

Ou aqueles gurus que dão palestras a incentivar a recepção e apoio aos alunos estrangeiros, afinal que também trarão dinheiro para dentro, quando se borrifam por completo nas milhares de desistências por impossibilidade de estudar que vão fazer implodir o sistema de ensino superior.

Largam uns patacos de apoio, através dos incorruptíveis bancos, para meia dúzia de afortunados escolhidos a dedo, mas os estrangeiros é que interessam.

Vivemos num país em desagregação, e nada do que possamos fazer ou dizer vai mudar isso.

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E depois do adeus II

3/9/2014

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Sob o exercício infantil da imaginação, imaginemos que assumimos brevemente a nossa posição de ultra-periferia. Portugal é a Bragança da Europa.






1)      Imagina que mandamos às malvas o tratado fascista assinado em Maastricht., onde se consagra uma Europa pela força do número demográfico, e onde se enterram os Estados-Nação sob o argumento de ‘cimentar a união/integração’.

Isto é na realidade um eufemismo, na melhor das expressões, para a velha Europa das grandes potências, a arrepio dos pequenos países, dos periféricos países face ao ‘olho’ ou ‘banana’ da Europa setentrional, herdeiro da Liga Hanseática.

As grandes nações, como as pequenas, são comandadas pelas grandes burguesias, grandes companhias, e por isso o mercado comum mais não foi e é que uma tentativa de hegemonia mundial da Europa ultrapassada em 1918, cujo pretexto foi evitar a guerra, que desde sempre foi originada pelas mesmas forças económicas que agora se defende como dogma capaz de evitar novos conflitos.

2)      Imagina que esta ideia de integração europeia não é mais que uma armadilha ou expressão delico-doce para uma diluição subserviente das independências nacionais ante uma finança e indústria transformadora transnacional que decide quando quer os paradigmas da interpretação do mundo por parte das massas. A cultura pop, burguesa, é a mais genial construção que visa fazer com que as pessoas se contentem com a sua mediocridade, abandonando as velhas utopias progressistas do passado em detrimento de um carpe diem hedonista e sem memória ou reflexão.

Imagina que os fundos de coesão, estranhamente não suficientemente policiados, são outro eufemismo para o mecanismo de habituação de um estado nação à sua servidão, amansado através de um conforto espúrio e imbecilizante, versão retorcida da história dos porcos selvagens domesticados através da rotina da doação de milho, à medida em que se vão construindo uma após uma, as cercas da sua clausura. Estamos fechados e já não vivemos sem oo milho que nos dão à boca, já mastigado.

3)      Imagina português que se fazem estradas com libertação descomunal de verbas europeias, para várias autoestradas cumprindo os mesmos trajectos,  de forma a garantir o escoamento de produtos de outras paragens, e como forma de acautelar um futuro onde a sucursal governativa dos ex estados nação, pode retirar dividendos e verbas para a sua auto-manutenção, criando o vicío e depois taxando o vício, a arrepio da desmantelação dos caminhos de ferro como transporte preferencial para as massas populacionais…

4)      Imagina português, que te deram dinheiro para desmantelares as tuas indústrias, disseram-te que éramos todos um, que não fazia sentido a redundância produtiva, e o bom aluno europeu a tudo anuiu, sem mínimo vislumbre de inconformação. Come um pouco mais de milho, dedica-te aos serviços e às migalhas que te vão deitando pelo chão, nacionalismos são coisa do passado, português, isso é mal visto…e que medo português, tens tu da opinião dos outros.

A Europa é superior a tudo isso, esmera-te em ser bom aluno e cumprir o que o mestre escola ordena. Não produzas, produzir é coisa do passado, 500 milhões, é um mercado dos 500 milhões, criam-se sinergias dizem-te eles. Indigente estás na última fila dos que rodeiam e se banqueteiam na mesa, saltas indigente e andrajoso, como sempre foste e fizeste, para ver um pouco do que se come, e de vez em quando é atirada para ti uma perna de frango já meio roída.

Contentas-te em anunciar ano após anos projectos de grande envergadura, Sines propriedade de Singapura apresentado como porta de entrada na Europa como se fosse imaginável a dimensão de Hamburgo, Roterdão ou Antuérpia.

É apresentada a maior albufeira da Europa como contorno de recorde do Guiness, quando a mesma é dedicada ao turismo faz de conta e aos campos de golfe que substituíram a produção agrícola, onde os estrangeiros abastados se podem dedicar ao lazer das novas monarquias.

Organizas a Expo 98, o maior exercício de especulação imobiliária até à altura, constróis o Centro ‘Cultural’ de Belém, onde de x em x tempo os papalvos acreditam que existe uma espécie de igualdade nas importâncias que cada estado tem.

Organizas um europeu de futebol a expensas públicas no decurso de encerramento de urgências hospitalares, maternidades e outros serviços públicos de importância menor em relação ao desporto rei.

Enches-te de orgulho destas grandezas. Na Europa és o eterno mordomo, canalizador, pedreiro, serviçal devoto, moço de fretes e prostituta. Tens o Durão Barroso na Comissão Europeia que tudo fez por Portugal, sem ele lá o que seria de nós, não teríamos a maior vaga emigratória da nossa História, nem 180 % do PIB de endividamento.

Ainda bem que serviu de mordomo na questão das armas de destruição maciça do assassinado Sadam, às mãos da coalição que se opunha ao eixo do mal.

5)      Bem vindo ao admirável mundo novo da economia de serviços e à emigração, português.

A Europa o exige, deslocalização da mão de obra formada barata para o centro da mesa onde todos comem, menos tu, que róis o que os outros não querem comer.

Deixa-te sentir no oásis, investe no petróleo verde, deslumbra-te com a paixão na educação, entretém-te com a mistura da política futebol e do futebol política.

Goza com os países de 3º mundo cujos líderes são caricaturas que alteram os feriados de natal, ou que matam os tios por traição, na tua aldeia o teu presidente de junta é no mínimo mais sério que essas sociedades atrasadas. Apontar o dedo aos outros, ainda que com razão, é tão fácil não é? E no fundo tu és um facilista, tudo é fácil contigo. Basta um pouco de milho.

6)      Quase 80% do corpo jurídico português é de origem europeia. É mais fácil alterar diariamente a lei para um ministro lucrar uns trocos com imobiliário, que tocar nas sacrossantas legislações de Bruxelas.

As leis fazem-se lá fora e adoram-se cá dentro como as tábuas de Moisés. O Parlamento Europeu é uma mistura palaciana de SPA e de paragem de ricos e importantes, enquanto na Quinta do Mocho ou na Serafina ainda há adolescentes a fazer abortos com pés de salsa. Enquanto pobres dormem na Estação Oriente encostados a embalagens tetrapack de vinho que faz esquecer a sorte que obtiveram na vida, sob o olhar judicativo da classe média que foi ver um cinema e deixou o monovolume no estacionamento subterrâneo.

A voz dos nossos deputados só tem existência dentro das suas cabeças, quando regressa após ressoar nas paredes ou no contexto das lutas de comadres partidárias, enquanto isso morres de fome, vergonha e desespero.

Não debates política porque cada um tem a sua ideia e ideias não se debatem, respeitam-se. E o que interessa é a integridade dos 500 milhões, desse mercado que observas sempre que olhas para o parque automóvel que representa os países onde se origina, e não há pavão português que não tenha um Mercedes ou BMW, como forma de projectar o seu prestígio para os observadores.

Serves apenas para fazer número e nada mais almejas que não isso, português.

7)Quem vai perdoar a quem nos lançou nesta situação idílica, e nos tirou a voz, que não fosse a do coma narcoléptico em que caímos?

8) Porque é que esta auto intitulada ‘Europa dos cidadãos’ não organizou um único acto democrático de sufrágio em território nacional?

Sim, gostaste da ilusão de te sentires moderno, válido, confortável, de igual para igual com os outros.

A Europa lançou dinheiro a rodos, milho, para dentro da vedação. Obras de modernização, que foram ganhas maioritariamente por empresas originárias dos países que mais contribuíam para o orçamento comunitário, financiando assim indirectamente as suas economias, um pouco como o Estado financia as empresas privadas através do IEFP, formando os trabalhadores poupando desse encargo as empresas, e ainda pagando parte dos ordenados, às empresas sempre necessitadas dos empregados subsidiados.

Calma português, não te apouquentes. Não é caso para isso.

Viste esses fundos consolidar uma classe média e alta corruptas, vivendo como sempre do expediente, das ‘políticas de transporte’ e do import-export; vise estas classes tornarem-se apátridas, e nada fizeste senão exigir o direito a futebol, novelas, deixaste desmantelar a coluna vertebral da República, a Educação, porque uma sereia te cantou que assim o ensino ficaria melhor, e seríamos mais competitivos. Acalentaste a ideia de dar vantagem ao teu filho e filha através da exclusividade, em colégios privados de lucros mas públicos no financiamento, tal como as cooperativas de ensino superior em que regra geral a qualidade é diminuta comparada com a exposição mediática, decorrente com a facilidade de concessão de gruas e passagens administrativas. E falaram-te em rigor no ensino, não para os alunos mas para os professores que em breve acumularam para ordenados diminuídos, a função de instruir, educar e aliviar a frustração dos teus filhos.

Culpas sempre as forças revolucionária desde 1976, quando votas anos após ano, há 40 anos, nas mesmas elites partidárias que te conduziram a 3 intervenções externas e à situação de divída e soberania de papel.

Como é possível legitimares através de voto eleições indirectas viciadas, para que ganhem os mesmos inaptos e despojados de coluna vertebral, os encantadores de serpentes, ilusionistas?

Como podes tu continuar após 40 anos a votar sempre em funcionários dos partidos?

Como podes tu eleger como teu representante o mais prolongado político nacional no exercício do poder, com responsabilidades directas na situação actual?

Como podes tu deixar alienar património público, nacional, sob o epíteto da divida pública quando na Europa há países mais endividados que Portugal e que não permitem que isso aconteça com eles?

Bravo português. Será que alguma vez te vais perdoar?

E o que vais fazer a todos aqueles que vivem, defendem, e contribuíram para este estado de sujeição? Vais votar neles?

Que vais fazer aos milhares que vivem de expedientes, que defendem uma sociedade impessoal e anónima, os operadores de crédito, os cobradores, os empresários de vão de escada, a legião dos serviços de subcontratação, dos coffe breaks, debrifiengs e casual Fridays, que acham finérrimo comer no Rock planet e tirar umas selfies?

Que vais fazer a toda esta filigrana social e económica que se agarrou como lapa ao casco submerso do navio, que o acompanha em direcção ao fundo a encoberto das variáveis águas em que zarpa?

Não os podes matar. Não podes deportar esta força de bloqueio. Também não os podes elucidar, ou fazer mudar de ideias, eles vão continuar a mijar no teu quintal só porque não gostam de ti ou dos teus cravos.

Tens de os tratar como doentes, como heroinómanos agarrados à droga do seu conforto e do seu umbigo.

Tens que trabalhar sim nas massas, sempre ansiosas da sua ascensão social, retira-lhes esse comportamento ovino, com a diluição das classes sociais ou de um escalonamento meritocrático. Não tenhas medo que ninguém morre ou nada pára.

Alguns dizem que só a generalização do mal estar pode criar o momentum para a revolução violenta. Mas duas perguntas se colocam, e são:

a)      Como lidar com o facto de que a mudança de postura dos conservadores, se depender do seu bem estar material, implica a morte de largas camadas da população, porque quem acumulou riqueza acha-se dela merecedor e inimigo de uma sociedade estritamente igualitária?

b)      Uma suposta mudança de posições poderá ser genuína, ou como sempre um cavalgar da onda, na qual a um processo revolucionário sempre se segue um processo contra revolucionário, em função da mesma manutenção das classes sociais privilegiadas, um pouco como é observado em toda a História de Portugal?

Imagina português que te dedicas a pensar nisto, e decides querer sair do redil onde te enfiaste.

Em meia dúzia de horas tinhas uma mão cheia de tanques vogando em linha recta de Madrid a Lisboa, para liquidar os separatistas, e implementar de novo uma democracia mais favorável.

Vais, de novo, ter de esperar que alguma grande nação te reconheça o direito à autodeterminação, pela qual terás de pagar copiosamente como sempre até que um dia seja celebrado como feriado nacional, até que algum governante se lembre de o abolir por ir contra a produtividade de uma qualquer argolada em que te tenhas enfiado de novo.

Nunca vais sair da cepa torta, português. O teu apego ao conforto é literalmente a razão da tua miséria.

E o teu fraco amor por ti mesmo leva a pensar que se calhar, és a única pátria amaldiçoada por si mesma.

...

Posição País Dívida externa dados Per capita e percentagem do PIB em US dollars
— Mundo (Total) 59,090,000,000,000 31 Dezembro 2010 est. 8 731 95%


1 Estados Unidos 14,392,451,000,000 30 Setembro 2010 46,577 97%— 14,166,135,000,000 3/4 de 2010 43,11 120%

Zona Euro
— 13,720,000,000,000 30 Junho 20108 27,382 83%

União Europeia
 
2 Reino Unido 8,981,000,000,000 30-jun-10 144,757 398%
3 Alemanha 4,713,000,000,000 30-jun-10 57,646 143%
4 França 4,698,000,000,000 30-jun-10 74,41 188%
5 Holanda 2,344,296,360,000 terceiro trimestre de 2010 226,503 344%
6 Japão 2,246,000,000,000 30-jun-10 17,546 51%
7 Noruega 2,232,000,000,000 30 Junho 2010 113,174 861%
8 Itália 2,223,000,000,000 30 Junho 2010 est. 39,234 124%
9 Espanha 2,166,000,000,000 30-jun-10 52,588 157%
10 Irlanda 2,131,000,000,000 30 Junho 2010 11 515,671 1224%
11 Luxemburgo 1,892,000,000,000 30 Junho 2010 12 4,028,283 4636%
12 Bélgica 1,275,601,020,000 3/4 de 2010 126,188 322%
13 Suíça 1,190,000,000,000 30-jun-10 182,899 364%
14 Austrália 1,169,000,000,000 31 Dezembro 2010 est. 42,057 131%
15 Canadá 1,009,000,000,000 30-jun-10 24,749 75%
16 Suécia 853,300,000,000 30-jun-10 72,594 241%
17 Áustria 755,000,000,000 30-jun-10 97,411 226%
— Hong Kong 754,631,000,000 3/4 de 2010 92,725 233%
18 Dinamarca 559,500,000,000 30-jun-10 110,216 274%
19 Grécia 532,900,000,000 30-jun-10 49,525 165%
20 Portugal 497,800,000,000 30-jun-10 47,632 201%
21 Rússia 480,200,000,000 30 Novembro 2010 est. 2,611 21%
22 República Popular da China 406,600,000,000 31 Dezembro 2010 est. 301 7%
23 Finlândia 370,800,000,000 30-jun-10 68,18 200%
24 Coreia do Sul 370,100,000,000 31 Dezembro 2010 est. 29,842 25%
25 Brasil 310,800,000,000 31 Dezembro 2010 est. 1,129 14%
26 Turquia 270,700,000,000 31 Dezembro 2010 est. 3,884 45%
27 Polónia 252,900,000,000 31 Dezembro 2010 est. 5,279 47%
28 Índia 237,100,000,000 31 Dezembro 2010 est. 187 18%
29 México 212,500,000,000 31 Dezembro 2010 est. 1,646 20%
30 Indonésia 155,900,000,000 31 Dezembro 2010 est. 651 28%
31 Hungria 134,600,000,000 31-dez-10 11,667 70%
32 Argentina 128,600,000,000 31 Dezembro 2010 est. 2,706 35%
33 Emirados Árabes Unidos 122,700,000,000 31 Dezembro 2010 est. 26,202 56%
34 Islândia 124,090,000,000 3/4 de 2010 10,67 35%
35 Roménia 108,900,000,000 31 Dezembro 2010 est. 4,459 59%
36 Ucrânia 97,500,000,000 31 Dezembro 2010 est. 2,275 90%
37 Cazaquistão 94,440,000,000 31 Dezembro 2010 est. 5,987 85%
38 República da China 91,410,000,000 31 Dezembro 2010 est. 3,452 21%
39 Israel 89,680,000,000 31 Dezembro 2010 est. 11,649 43%
40 República Checa 86,790,000,000 31 Dezembro 2010 est. 7,318 39%
42 Chile 84,510,000,000 31 Dezembro 2010 est. 3,586 43%
43 Arábia Saudita 82,920,000,000 31 Dezembro 2010 est. 2,839 20%
44 Tailândia 82,500,000,000 31 Dezembro 2010 est. 990 25%
45 África do Sul 80,520,000,000 30-jun-10 1,497 26%
46 Qatar 71,380,000,000 31 Dezembro 2010 est. 51,856 75%
47 Nova Zelândia 191,008,000,000 Dezembro 2010 16 33,418 127%
48 Malásia 62,820,000,000 31 Dezembro 2010 est. 1,738 25%
49 Filipinas 61,850,000,000 31 Dezembro 2010 est. 576 33%
49 Colômbia 61,777,400,000 3rd quarter of 201017 1,052 21%
50 Croácia 59,700,000,000 31 Dezembro 2010 est. 13,39 94%
51 Eslováquia 59,330,000,000 30-jun-10 9,706 55%
52 Paquistão 57,210,000,000 31 Dezembro 2010 est. 318 31%
53 Kuwait 56,810,000,000 31 Dezembro 2010 est. 9,191 29%
54 Venezuela 55,610,000,000 31 Dezembro 2010 est. 1,517 13%
55 Iraque 52,580,000,000 31 Dezembro 2010 est. 1,61 76%
56 Eslovénia 51,570,000,000 30-jun-10 27,282 112%
57 Malta 41,020,000,000 30-jun-10 9,08 45%
58 Sudão 37,980,000,000 31 Dezembro 2010 est. 927 66%
59 Letónia 37,280,000,000 31 Dezembro 2010 est. 16,811 145%
60 Bulgária 36,150,000,000 31 Dezembro 2010 est. 6,511 105%
61 Líbano 34,450,000,000 31 Dezembro 2010 est. 5,473 63%
62 Vietname 33,450,000,000 31 Dezembro 2010 est. 355 34%
63 Peru 33,290,000,000 31 Dezembro 2010 est. 1,032 24%
64 Chipre 32,860,000,000 31 Dezembro 2008 est. 41,648 129%
65 Sérvia 32,310,000,000 31 Dezembro 2010 est. 4,297 74%
66 Egipto 30,610,000,000 31 Dezembro 2010 est. 371 15%
67 Lituânia 27,600,000,000 31 Dezembro 2010 est. 10,924 98%
68 Bielorrússia 24,800,000,000 31 Dezembro 2010 est. 3,007 57%
69 Bangladesh 24,460,000,000 31 Dezembro 2010 est. 141 25%
70 Marrocos 22,690,000,000 31 Dezembro 2010 est. 633 22%
71 Estónia 22,125,000,000 31 Dezembro 2010 est. 16,51 114%
72 Singapura 21,660,000,000 31 Dezembro 2010 est. 4,042 11%
73 Cuba 19,750,000,000 31 Dezembro 2010 est. 1,698 34%
74 Tunísia 18,760,000,000 31 Dezembro 2010 est. 1,5 39%
75 Monaco 18,000,000,000 2000 est. 565,043
76 Angola 17,980,000,000 31 Dezembro 2010 est. 741 19%
77 Sri Lanka 17,970,000,000 31 Dezembro 2010 est. 961 47%
78 Guatemala 17,470,000,000 31 Dezembro 2010 est. 534 20%
79 Equador 14,710,000,000 31 Dezembro 2010 est. 941 23%
80 Bahrain 14,680,000,000 31 Dezembro 2010 est. 10,462 54%
81 Panamá 13,850,000,000 31 Dezembro 2010 est. 3,475 49%
82 Uruguai 13,390,000,000 31 Dezembro 2010 est. 3,77 40%
83 República Dominicana 13,090,000,000 31 Dezembro 2010 est. 1,312 25%
84 Irão 12,840,000,000 31 Dezembro 2010 est. 166 3.7%
85 Jamaica 12,660,000,000 31 Dezembro 2010 est. 4,26 97%
86 Coreia do Norte 12,500,000,000 2001 est. 582
87 Costa do Marfim 11,600,000,000 31 Dezembro 2010 est. 565 54%
88 El Salvador 11,450,000,000 31 Dezembro 2010 est. 1,976 55%
89 Nigéria 11,020,000,000 31 Dezembro 2010 est. 64 6%
90 Costa Rica 9,126,000,000 31 Dezembro 2010 est. 1,744 27%
91 Omã 8,829,000,000 31 Dezembro 2010 est. 2,522 14%
92 Bósnia e Herzegovina 7,996,000,000 31 Dezembro 2010 est. 2,102 49%
93 Quénia 7,935,000,000 31 Dezembro 2010 est. 215 24%
94 Síria 7,682,000,000 31 Dezembro 2010 est. 374 15%
95 Tanzânia 7,576,000,000 31 Dezembro 2010 est. 174 32%
96 Iémen 7,147,000,000 31 Dezembro 2010 est. 264 25%
97 Myanmar 7,145,000,000 31 Dezembro 2010 est. 123 27%
98 Gana 6,483,000,000 31 Dezembro 2010 est. 253 38%
99 Líbia 6,378,000,000 31 Dezembro 2010 est. 1,025 11%
100 Bolívia 6,130,000,000 31 Dezembro 2010 est. 523 30%
101 Zimbabwe 5,772,000,000 31 Dezembro 2010 est. 496 132%
102 Jordânia 5,522,000,000 31 Dezembro 2010 est. 1,121 29%
103 Macedónia 5,520,000,000 31 Dezembro 2010 est. 2,648 59%
104 Arménia 5,227,000,000 30-jun-10 1,368 51%
105 Maurícia 5,043,000,000 31 Dezembro 2010 est. 3,565 52%
106 República Democrática do Congo 5,000,000,000 2000 est. 1,722 155%
107 Turquemenistão 5,000,000,000 2009 est. 934 31%
108 Moçambique 4,990,000,000 31 Dezembro 2010 est. 197 42%
109 Nepal 4,500,000,000 2009 161 36%
110 Paraguai 4,346,000,000 31 Dezembro 2010 est. 513 22%
111 Camboja 4,338,000,000 31 Dezembro 2010 est. 298 38%
112 Trinidad e Tobago 4,303,000,000 31 Dezembro 2010 est. 1,589 10%
113 Congo, Democratic Republic  4,300,000,000 2009 est. 164 100%
114 Etiópia 4,289,000,000 31 Dezembro 2010 est. 51 13%
115 Uzbekistan 4,236,000,000 31 Dezembro 2010 est. 130 11%
116 Moldova 4,146,000,000 31 Dezembro 2010 est. 1,113 73%
117 Algeria 4,138,000,000 31 Dezembro 2010 est. 97 2%
118 Nicaragua 4,030,000,000 31 Dezembro 2010 est. 743 76%
119 Senegal 3,885,000,000 31 Dezembro 2010 est. 216 22%
120 Kyrgyzstan 3,738,000,000 30-jun-10 653 68%
121 Honduras 3,540,000,000 31 Dezembro 2010 est. 423 23%
122 Zambia 3,495,000,000 31 Dezembro 2010 est. 277 25%
123 Georgia 3,381,000,000 31-dez-09 771 31%
124 Cameroon 3,344,000,000 31 Dezembro 2010 est. 147 13%
125 Azerbaijan 3,221,000,000 31 Dezembro 2010 est. 269 6%
126 Libéria 3,200,000,000 2005 est. 930 606%
127 Laos 3,085,000,000 2009 est. 484 55%
128 Guinea 3,072,000,000 31 Dezembro 2009 est. 290 70%
129 Somália 3,000,000,000 2001 est. 393
130 Madagáscar 2,973,000,000 31 Dezembro 2010 est. 99 24%
131 Benin 2,894,000,000 31 Dezembro 2009 est. 135 22%
134 Uganda 2,888,000,000 31 Dezembro 2010 est. 62 13%
135 Mali 2,800,000,000 2002 240 84%
136 Afeganistão 2,700,000,000 2008 96 23%
137 Gabon 2,374,000,000 31 Dezembro 2010 est. 2,078 28%
138 Namíbia 2,373,000,000 31 Dezembro 2010 est. 569 13%
139 Botswana 2,222,000,000 31 Dezembro 2010 est. 910 14%
140 Niger 2,100,000,000 2003 est. 178 79%
141 Burkina Faso 2,002,000,000 31 Dezembro 2010 est. 128 23%
142 Tajikistan 1,997,000,000 31 Dezembro 2010 est. 260 34%
143 Mongólia 1,860,000,000 2009 690 44%
144 Chad 1,749,000,000 31 Dezembro 2008 est. 177 27%
145 Serra Leoa 1,610,000,000 2003 est. 311 163%
146 Albania 1,550,000,000 2004 497 21%
147 Papua Nova Guiné 1,548,000,000 31 Dezembro 2010 est. 366 29%
148 Seychelles 1,374,000,000 31 Dezembro 2010 est. 14,706 163%
149 Malawi 1,213,000,000 31 Dezembro 2010 est. 78 24%
150 Burundi 1,200,000,000 2003 167 202%
151 Central African Republic 1,153,000,000 2007 est. 270 68%
— Cisjordânia 1,300,000,000 2007 est. 552
152 Belize 1,010,000,000 2009 est. 2,982 70%
153 Guiné-Bissau 941,500,000 2000 est. 722 203%
154 Bhutan 836,000,000 2009 1,239 66%
155 Equatorial Guinea 832,000,000 31 Dezembro 2010 est. 136 1%
156 Guyana 804,300,000 30 September 2008 1,049 42%
157 Barbados 668,000,000 2003 2,456 25%
158 Montenegro 650,000,000 2006 939 24%
159 Lesotho 647,000,000 31 Dezembro 2010 est. 233 36%
160 Maldivas 589,000,000 2009 est. 1,707 43%
161 Gâmbia 530,000,000 31 Dezembro 2010 est. 438 170%
162 Suriname 504,300,000 2005 est. 1,011 28%
163 Suazilândia 497,000,000 31 Dezembro 2010 est. 520 18%
164 Haiti 494,000,000 31 Dezembro 2010 est. 48 7%
165 Saint Vincent and the Grenadines 479,000,000 2010 2,084 54%
— Aruba 478,600,000 2005 est. 4,935 21%
166 Djibouti 428,000,000 2006 573 56%
167 Antigua and Barbuda 359,800,000 jun-06 4,388 36%
168 Grenada 347,000,000 2004 3,402 74%
169 Bahamas 342,600,000 2004 est. 1,067 6%
170 Cabo Verde 325,000,000 2002 722 53%
171 São Tomé e Príncipe 318,000,000 2002 2,193 349%
172 Saint Kitts and Nevis 314,000,000 2004 6,408 79%
173 Eritrea 311,000,000 2000 est. 87 44%
174 Saint Lucia 257,000,000 2004 1,586 32%
176 Comoros 232,000,000 2000 est. 420 115%
177 Dominica 213,000,000 2004 3 75%
178 Samoa 177,000,000 2004 994 47%
179 Ilhas Salomão 166,000,000 2004 355 44%
— Bermudas 160,000,000 FY99/00 2,56
— Ilhas Cook 141,000,000 1996 est. 7,756
180 Fiji 127,000,000 2004 est. 150 5%
181 Marshall Islands 87,000,000 2008 est. 1,377 54%
182 Vanuatu 81,200,000 2004 383 22%
183 Tonga 80,700,000 2004 791 33%
— Nova Caledónia 79,000,000 1998 est. 404
— Ilhas Cayman 70,000,000 1996 2,078
— Ilhas Feroé 68,100,000 2006 1,409
184 Micronésia 60,800,000 FY05 est. 563
— Gronelândia 58,000,000 2009 1,007
— Ilhas Virgens Britânicas 36,100,000 1997 1,897
185 Nauru 33,300,000 2004 est. 2,599
186 Kiribati 10,000,000 1999 est. 120 14%
— Montserrat 8,900,000 1997 14,958
— Anguilla 8,800,000 1998 818
— Wallis e Futuna 3,670,000 2004 244
— Niue 418 2002 est. 196
187 Brunei 0 2005 0 0%
188 Liechtenstein 0 2001 0
— Macau 0 2009 0 0%
189 Palau 0 FY99/00 0

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Cigarras e Formigas I

10/17/2013

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I

Da muita cultura reaccionária que podemos rememorar, a mais insidiosa e perigosa, está nos contos infantis.

O mais atávico para mim é o da cigarra e da formiga.

Quando era miúdo, uma das histórias que mais me intrigava e irritava ao mesmo tempo era a da cigarra e a da formiguinha.

Nela uma cigarra cantava no Verão enquanto a formiga labutava e a tempos avisava a cigarra de que o Inverno se aproximava, e depois não teria que comer, ao que a cigarra respondia com jactância vivendo a vida com alegria e cantoria alheia ao planeamento logístico avançado da formiga. Chega a altura em que a fábula moral se conclui com a desgraçada cigarra morrendo de fome e frio e a formiga soberba a acolhe e dá de comer após a sentença moral de que como a cigarra lhe alegrara o Verão, merecia permanecer viva.

Ainda hoje não sei porque me irritava.

Munido da moralidade fundamentalista que só as crianças podem ter, julgava a cigarra como inconsciente apesar de não perceber como era tão castigada na entoação de quem me contava a história apenas por se dedicar aos vícios do canto em dias de Verão. Que devassidão nesse ser dedicado ao pecado do canto e da preguiça.

Outro dos significados implícitos, destinados a educar as crianças, era a da recompensa do trabalho árduo estival, frutificado no Inverno, com imagens de uma formiga com comidinha e no quentinho do seu lar. Os adultos pareciam dizer-nos que ‘trabalha agora para teres depois’ além de que ‘as costas ao alto depois dão sobressalto’. A fábula pretende sublinhar a previdência, o planeamento, e a visão realista sem deslumbramento da existência. Um ‘caute’ espinosiano.

II

Irritava-me talvez por causa da sujeição da cigarra à vontade da providente formiga, avisada que fora a tempo, e por não compreender que alegria intoxicante pode haver em cantar dias a fio, de molde a arriscar a vida e a dignidade ao ponto de se esquecer que no Inverno teria de comer o que produziria no Verão. Julgava assim a negligente cigarra não a compreendendo.

Estava no poder da cigarra evitar pedir e arriscar a vida. Não o fez. Era acima de tudo isso e aquilo que era a sua burrice (para mim) de não fazer o que fazem as respeitáveis formigas.

Ora há uma sabedoria mais fatal na atitude da cigarra que aparenta à  1ª vista.

A cigarra não é negligente, é reactiva. Ela sabe que se não trabucar não pode manducar, o que ela faz é negar o mundo de trabalho, o mundo de necessidade e esforço autotélico das formiguinhas. Mesmo que cantasse para atrair machos ou fêmeas, ou pelo gosto de cantar, hoje parece-me bem mais razoável que a formiga, autómata, a cigarra aproveita a vida a formiga safa-se nela. Vive no Inverno do trabalho acumulado no Verão, cumpre metodicamente o seu objectivo egoísta, a outra entrega-se a apreciar a vida. Rejeita e depois sujeita-se, e esse é o único motivo que degrada a cigarra, aceitar o que havia rejeitado.

A formiga não tem por onde se lhe pegar. Exerce a sua provisão abnegadamente, ciente de um mundo de escassez,  encerrada no seu propósito e culmina numa lição de moral de capela condoída de escrúpulos de última hora perante aquela que laborara afinal de forma diferente. Sabendo que cantar também é trabalho, porque insiste no sermão a formiga?

Para castigar outro ser que se havia dedicado a apreciar a vida em grupo e não no privado Inverno de chinelos  da formiguinha.

É a vida contemplativa que é castigada.

III

A fábula moral ensina desde cedo que a censura apenas opera num sentido.

Só a formiga, ente colectivo e despersonalizado, semelhante a milhares de tantas outras tem o poder de censurar, de deitar postas de pescada, avisos e reprovações. A formiga acima de tudo ensina-nos a segurança da igualdade. A esperteza de esperar recompensa se jogarmos pelas regras. A virtude de um autosacrificio em nome próprio, mais profundo ainda, o valor do calculismo de pendor  imediato e prático, a chico esperteza.

Esta adequação bovina às leis e esperança por recompensa está no núcleo do carácter conservador e atávico de grandes massas populacionais.

Joguemos pelo seguro. Não sejamos parvos ou levianos. Respeitemos a ordem milenar da abnegação.

Acontece que desde que se optou por um regime republicano estruturado em democracia, ou em algo parecido, que se vive num sistema cuja definição implica a força da maioria em submeter a globalidade social ao seu desígnio. Um dos grandes logros da civilização europeia está em fazer acreditar que a maioria (  a soma numérica de cabeças) pensa melhor que as minorias, e que a maioria obedece a um critério de justiça no qual o interesse do maior número reina sobre os interesses particulares. Só uma formiguinha embriagada acreditaria nisto. A cigarra consciente canta para não rever esta ingenuidade.

Quando se observa calmamente o cidadão português nosso próximo, e se esmiúça a sua forma de pensar e encarar o mundo, ficamos com a ideia que deveríamos cometer seppuku.

As pessoas que decidem por mim, não são mais esforçadas, mais esclarecidas, ou mais preocupadas com o bem estar geral, que eu. Pelo contrário. Fazem da ovinidade uma arte, esvoaçam ligeiramente pelo frívolo, e rejeitam a responsabilidade que um republicano deve abraçar. Não cometeria o pecado de me identificar com os ‘melhores’ não fosse o facto de achar que estes maioritários de que falo são mesmo do pior.

Confirmo-o em cada manobra perigosa da estrada ou falta de civismo defendida com galhardia, ou na exposição da mundividência mediante a qual a esperteza, a previdência comezinha e anafada do Inverno que se aproxima, tolhem  a visão de um futuro mais prolongado. Não sabe o vulgo viver em comunidade nem organizar o futuro, a sua organização é de vista curta e extremamente materialista.Não tem portanto, virtude.

Tenho eu de me submeter ao voto de quem exulta com ‘reality shows’ e defende o seu direito a estacionar em 2ª fila perante mim, e se desculpabiliza e corrige de imediato se por acaso é a polícia a alertar para o mesmo facto? Este último facto é importante, o que está em causa não é a natureza da ofensa mas a origem da chamada de atenção.Eu não sou ninguém, não apresento ameaça, nem tenho «autoridade» ou dever de chamar a atenção a ninguém. A populaça só acha que pode ser chamada à atenção por alguém que considere superior ou aos que podem trazer sarilhos para a sua excitante vida.

Revela-se portanto uma preocupação em levar uma vida fácil e folgada, sem chatices e torcendo as circunstâncias em benefício próprio, rejeitando a intervenção civíca do próximo.  Experimente o caro leitor solicitar a alguém para apanhar o papel que acabou de deitar para o chão ou para trocar o jogo de futebol pela assembleia de freguesia. É esta mentalidade que nos define como maioria e que nos submete à sua superior sapiência.

Agora que um curso superior já não dá emprego valorizável e certo, que devem os mais esclarecidos fazer? O que fazer com tanta bibliografia devorada, e tanto pensamento elaborado? Ceder à imediaticidade e à prática? Quem as determina? Quem são os líderes partidários senão os mais motivados nas jogadas de bastidores e ao completo arrepio de existência de coluna vertebral efectiva? Estes são os premiados pela nossa democracia, os covardes, os sabujos, os que apenas se sabem safar num meio artificial endógeno, a ‘política’.

Tenho eu de me submeter ao grunho para ser governado pelo bufo incompetente?

A própria instrução não é sinónimo de esclarecimento, pois conheço muita gente com doutoramentos e pós doutoramentos que por causa do título acham que podem falar de assuntos sobre os quais nada percebem.

Sentem-se autorizados, e aqui o termo é mesmo AUCTORITAS, pela obtenção de uma distinção artificial, cuja pompa é real. Foi este sentimento que levou a um surto demográfico de graus académicos na política sem melhorias assinaláveis na sua forma de exercício. Muito titular de graus académicos, é poeta estando calado.

IV

Desde que me lembro do Tratado de Methuen dado no preparatório e revisto no secundário que me pergunto sobre a utilidade da História na tomada de decisão do presente. Como foi possível chegarmos a colonato inglês, como foi possível passar alguns verões cantando e quase morrer de fome nos seguintes invernos. Que condições seriam essas que deixaram os ébrios de então prejudicar tanto a pátria?

Mais espanto sinto hoje em dia pelo logro pior da camisa de forças em que estamos, bem pior que o Tratado de Methuen. E sempre houve gente disso consciente, então, como agora há sempre alguém com lucidez. Eu humildemente sempre informei os meus próximos sobre a importância de estarmos atentos, da militância política sistemática, de se comprar produtos nacionais bem como da importância teimosa de autonomia a arrepio de tudo e todas as pressões.

Nos tempos em que entravam mais milhões da Europa que jactos espanhóis em espaço aéreo nacional, ninguém ou quase ninguém queria saber, era a Expo 98, o Euro, as cidades da cultura e as casa da música, era o melhor dos mundos e havia tanto plasma tft para comprar. Havia viagens para fazer, olhos da Maddie e solidariedade para com Timor para meter nas janelas junto da bandeira da selecção nacional de futebol. Eu e outros vimos isto e alertámos os semelhantes. Os que se estão a borrifar, os grunhos e os próprios jotas e sabujos partidários.

A grande ideia que se deixa é portanto a de que as minorias da população que podem ser úteis à maioria são sistemática e convenientemente alheadas de tomadas de decisão e limitadas a um espaço de manobra nulo . A mediocridade vence e uniformiza.

A servidão voluntária de La Boétie nunca foi tão actual como agora. As pessoas vivem de acordo com as regras que se lhe apresentam, tornando-se assim o instrumento da sua menoridade e de todos aqueles que podem contribuir para uma hipotética libertação.

Enquanto quisermos fazer a right thing e ser os alunos bem comportados da Europa e do mundo, os pacóvios que sempre fomos, não vale a pena sonhar com liberdade. Resta-nos assumir o papel de cigarra cantando e os males espantando agarrados a um tronco de oliveira pesarosos, pois vamos sempre estar dependentes das formigas que nos causam tanta angústia mas que no fim acabam por nos alimentar com o pão da náusea, pois só existe um sistema com as massas, e são elas que cilindram a evolução social ao sabor de cânticos acéfalos e efémeros.

Cantemos irmãos.

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Académicos -parte III

10/12/2013

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I

         Lembro-me dele quando a licenciatura que tirava lhe projectava uma aura de abertura de espírito e espanto pelas coisas que vejo agora que não era mais que aura.

Aos temas falados, os olhos brilhavam num aparente fascínio pela complexidade do mundo e de uma sofreguidão por saber mais.

Servia a licenciatura não só para aprender, como para mostrar a si mesmo a sua dignidade, o seu valor próprio, em situação análoga à de Lúcia que havia tirado uma licenciatura só porque havia em horário nocturno. A licenciatura e o caminho académico começa para muitos a ser uma forma de valorização própria, não do saber pelo saber, mas essencialmente por se partilhar ainda a ideia comum de que uma pessoa com estudos ‘vale’ mais que uma sem estudos. Ser ninguém na vida é um medo equivalente ao sentimento de não se ser digno ou de se ser inferior a outros, o grau académico é para grandes franjas da populção, madeira para a fogueira da vaidade ou a única forma de fugir a humildes origens.

O  licenciado findo esse trajecto, acha que conseguiu algo, e olha já para si como fazendo parte de uma pequena elite, em que as diferenças intrínsecas se devem mais a capacidade de trabalho que a diferenças genéticas, reservadas a restante percentagem populacional que não tem interesse ou cabeça para os estudos.

Pode o jovem estudante de licenciatura, mastigar-se em lamentos perante os pais, por estar no desemprego, a culpa é do mercado, tempo perdido, emigrar, coitado do meu filho, especialmente quando qualquer curso serve para fazer a vontade aos pais que geralmente nunca puderam estudar e querem dar esse privilégio aos filhos, uma vida melhor com ideias dos tempos em que ter um canudo era sinónimo de desafogo financeiro. Esta geração de nossos pais, compensa com egoísmo perante todos o altruísmo a favor dos filhos. Que se lixem os filhos dos outros, o que interessa é que o nosso se safe. Não sejas parvo, esforça-te e acaba isso para poderes ser alguém. Com a 4ª classe ou nem isso, estes milhares de migrantes nas grandes urbes do país, inculcam nos filhos o atavismo de alfaia que trouxeram da aldeia. Por amor, por profundo amor reclamam da injustiça do mundo perante os seus filhos desempregados, na exacta medida em que desprezam ou defendem a condição dos filhos dos outros que nãos lhes interessa senão por analogia para com a situação da sua prole.

Esta geração de pais cinquentões, que viveu o 25 de Abril com sangue pueril na veia, é a geração que paga as contas deste país ao mesmo tempo que o mergulha no atavismo de sempre e na pasmaceira que é criticada pelos filhos emigrantes no estranjeiro. Culpam estes erradamente as mentalidades, os políticos, sem se perceber que o dano está naqueles que se sacrificaram por eles, e que eles mesmos fazem parte de uma longa lista pelos séculos de expatriados que cospe fel e sonha mel sobre Portugal quando fora dele.

Só assim se percebe a facilidade com que se desmantelou o ensino superior público e gratuito, como se sustentam salários de miséria e a ideia de que há mais dignidade numa licenciatura que nas virtudes públicas de defesa do interesse comum.

II

Após a licenciatura veio o mestrado e o sentimento de ter tido aproveitamento em 180 créditos bolonheses dá a convicção de que se pode falar com conhecimento de causa sobre qualquer assunto, como se obter aprovação num programa básico de universidade legitime o detentor numa aprovação universal, e dele faça um apto a debater o quer que seja.

Não é a mesma postura, já não é um fascínio por aprender ou pelo novo, é já projectar uma certeza íntima assente num esforço de estudo de determinados assuntos, de superação de avaliações e trabalho árduo, que dá ao detentor de grau de ensino uma projecção de competência para todo o campo do saber humano, excepto aqueles que de tão diametralmente opostos, forçam o estudante a rejeitar implicitamente qualquer discurso em tudo aquilo que mostre que continua a ser ignorante na maior parte dos assuntos. Posição ganha é para  ser mantida.

No mestrado, a basófia, ou seja, a convicção interior que se projecta para fora, é um apêndice do projecto de especialização em que i indivíduo se lança, não apenas porque o assunto lhe interessa, mas porque também há algo que se ganha na especialização. Pontos no micro cosmos académico, auto imagem, imagem que se projecta para os outros, uma espécie de identificação temática análoga à de adoslecente por banda de heavy metal ou boys band.

Sentimento de pertença, sentimento de progressão. O mestre ou mestrando já não é um estudante de licenciatura, progrediu, não meramente nos estudos mas no status, na crença interior de ir à frente.

Acha que já trata a academia por tu, conhece-lhe as regras e defende-as, defende tudo o que lhe conforma a ilusão de onde tira o seu auto valor.

Dizem ao mestrando que o grau onde está inscrito aprofunda o seu conhecimento, acima dos outros licenciados, e mais do que o fascínio por outra jornada assiste-se geralmente a uma consolidação da solenidade pomposa com que a academia é formada, como dizia Orlando Vitorino, as universidades estão vazias.

III

O universo castrense da universidade é um terreiro de progressão social fictícia. Com a imobilidade social endémica que caracteriza Portugal, a Universidade assume-se como placebo, como terreiro virtual onde a progressão nos estudos dignifica e glorifica o sujeito anónimo, mesmo que virtualmente e apenas na sua cabeça. Quando confrontado com outros que numa suposta meritocracia lhe estão abaixo apenas nos estudos e não nos salários, lhe acorre o ressentimento de se sentir superior e especial por não ser reconhecido. Lamenta o mundo que não o reconhece como ser supremo, e igualmente capaz como todos os outros de ser um ‘grande’.

Todos sabemos que é a cunha a lei, mas a indignação fácil é mais saborosa quando nos ofendemos com a discrepância entre os eleitos e a nossa dignidade académica, onde os títulos e realizações são medalhas das batalhas travadas, não para a vitória mas para se poder dizer que se lutou.

Urramos quando saem noticias sobra falsos graus académicos ou nomeações não baseadas em habilitações.

O estudante da mais obscura universidade privada, por exemplo de Relações Internacionais, acha-se em igualdade de circunstância para com o aluno de Medicina que logo desde o 1º ano recebe blocos de papel e canetas com as marcas de medicamentos que receitará no futuro.

O aluno de Letras que fugiu à Matemática acha-se injustiçado por pagar a mesma propina para o desemprego quando apenas ele custeia as fotocópias de livros demasiado caros,  o aluno de Medicina é mais considerado por ser mais útil e glamouroso além de acarretar mais custos em laboratórios e afins, apesar de pagar a mesma propina.

Não há igualdade entre os cursos e há crenças ocultas como a de que Letras são tretas e que só os cursos com empregabilidade são dificeis e dignos. O resto são artefícios que as pessoas usam para dizerem que se ‘formaram’.

O engenheiro do Técnico acha que todos os outros cursos que não os de engenharia são óptimos para encontrar namoradas e que os rapazes que lá andam ou são maricas ou inaptos para a complexidade da exactidão...e nada percebem de um mundo leibniziano.

Transversal, portanto a todo o mundo da academia, está a posição social.

Qualquer diferenciação social acarreta conservadorismo, pois quem tem a melhor mão, não a quer abrir. Humano é.

IV

O meu amigo mal começou o doutoramento. Mas já, por amizade, me dá lições sobre a vida académica, sobre o afã de publicar, e ser alguém na academia. Todo o académico acalenta o sonho de dar aulas, de pertencer a uma profissão considerada e estável. Ser alguém.

Ser convidado para palestras e conferências, ver pessoas a tirar notas ao que dizemos ter público e honrarias.

Sermos citados intra e extra muros, sermos alguém. Pelo caminho deixamos as peles andrajosas de cobra que testemunham a metamorfose de um ser iludido em aprender, que apenas pretendia ser considerado. Pergunta-se à boca cheia nas cantinas destas universidades que fazer dos nossos cursos, que empregos vamos ter...e eu sempre pergunto se um curso só vale pelo valor empregável que tem para ti...mas temos de viver, pois eu sei mas não devias deixar que tanta practicidade te condicionasse a forma de ver a assimilação de saber. Pelo menos é o que eu penso.

Aprender é algo que estimo acima de tudo, por me fazer crescer como pessoa e de poder colocar o meu esforço ao serviço da comunidade.

Era bom viver do meu trabalho na minha área de estudo, mas não é isso que me vai condicionar a progressão.

Entretanto os nossos amigos doutorados, homenageiam-se a si mesmos, glorificam-se e reproduzem-se entre si.

Falam já com certezas desarmantes sobre qualquer assunto que a sua especialização aguda legitima.

Vêm-nos a certeza não de uma adesão interior, mas de uma longa carreira de revisão de pares.

O ‘Dr.’ o ‘Professor’ antecede qualquer nome com entoação pomposa, que à primeira vocalização parece uma celebração académica do outro mas é sob mais fria análise, uma glorificação própria de si mesmo através do corpo académico. Não raras vezes os nossos professores falam do seu ponto de chegada como o culminar de uma difícil etapa, só acessível a eleitos, raramente se encontra um honesto o suficiente para dizer que ignora determinados assuntos.

Este assunto é por deveras triste, não porque se deva censurar a academia mas porque penso que a academia era a nossa única esperança, de construir uma sociedade técnica e equilibrada baseada no saber para mitigar as maleitas ‘humanas’, mas não se pode pedir ao tigre para orientar os cordeiros.

É a universidade portanto um factor de conservadorismo social e político.

V

Em 3 ou 4 anos as pessoas mudam imenso de acordo com as suas posturas e posicionamentos na via sacra das habilitações.

O saber é meio e não fim, e o meio não é altruísta.

Leite Vasconcelos era académico conhecido por sua aversão aos académicos. Como é compreensível nos dias de hoje, perante o atavismo também presente na academia nacional.

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Estertor

10/12/2013

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I

Num dos programas mediáticos de televisiva auto-flagelação, mascarada de catarse, um alemão tentava explicar a mentalidade portuguesa a partir da dicotomia do crime e do castigo sob um ponto de vista religioso, o teutão protestante paga o mal que cometeu, o católico meridional carrega a culpa como se de uma nódoa em polo Lacoste.

Um sabe que falhou e tem de pagar o outro vira-se para a Providência e cogita sob o peso existencial do seu erro castigado.

Embora se deva rejeitar esta leitura simplista, deve-se no entanto pensar sobre um pormenor, o da responsabilidade pessoal assumida frontalmente, versus a da responsabilidade assumida por via de 3º (destino, Deus, sistema social, etc.).

Não há, creio, uma acção concertada de teutões protestantes para menorizar os católicos do Sul por serem católicos do Sul, há capitalismo. Mas o mal que o outro nos faz so dependena verdade na nossa doação da outra face. Uma lambada qualquer um leva, dar a outra face é que só alguns são capazes. Ao assumir pessoalmente a ‘culpa’ responsabilizo-me a mim pelo decurso das minhas acções ou inacção ( que é também uma acção).

Ao projectar a culpa para um castigador externo, coloco-me numa peça cósmica segundo a qual é o homem perante a criação, ou perante o Criador, é a natureza humana individuada perante as relações que a condicionam, e assim em uníssono nasce a ideia de determinação.

O culpado protestante cai em introspecção, o católico em contemplação pactuante. Só assim se explica que a grande parte das lutas a favor de sociedades laicas e que tentam abolir a luta de classes, com a abolição das classes, ocorreram  acima do Sena.

II

A corrupção é a degradação lenta e inexorável das condições seminais de qualquer projecto. A oligarquia vigente, o reino das quintas nacionais, é a corrupção de uma ideia vigente que orientou os obreiros da República, mais que retirar os monárquicos do poder. É certo que como no 25 de Abril há sempre largas franjas de oportunistas que se posicionam para substituir as velhas elites ou mesmo as elites que intendem perpetuar a sua importância.

A República portuguesa está doente, e é corrupta, corrupta até à medula.

Quando se enuncia como Virginia López a quantidade de casos de largo âmbito que se tornam por sistema obscuros e sem objecto, a justiça portuguesa está presa por interesses contra os quais deveria trabalhar e estar isenta. É para isso que paga a população e não para um placebo de justiça. Será que é a astúcia e ambição dos advogados? Ou a corrupção dos juízes que causa a inimputabilidade dos acusados?

a)Camarate;

b)Fax de Macau;

c) Hemofílicos de Évora;

d) Saco Azul (Fátima Felgueiras);

e) Moderna;

f)Casa Pia;

g) Freeport;

h) Apito Dourado;

i) Portucale;

j) Isaltino de Morais;

k) Sócrates-Independente/Relvas-Lusófona;

l) Submarinos, Pandur, Patrulhas, kits MAFFS dos C130;

m) Operação Furacão;

n) BPN;

o)Face Oculta.

Podíamos continuar repetindo várias vezes o alfabeto. A justiça em Portugal é para rir, apenas os pequenos prevaricadores, os que mandam o Presidente da República trabalhar, temem pela vida, os que lhe chamam palhaço levam uma reprimenda de enfant térrible após pedido de desculpas apressado. A percepção que o comum tem da justiça é esta, a de que não é cega. Em todos os caso anteriormente citados o bem estar e riqueza pública foram prejudicados, bem como foram expostas teias de influência.

Como reage o cidadão comum, que não jornalista a soldo ou comentador pago? Inundando os centros comerciais e estádios de futebol, espancando os professores dos filhos, ou exultando com qualquer menorização das profissões que abomina por inveja. Como reaje o cidadão? Não indo votar quando é feriado ou dia de praia, julgando que é um activista feroz por tal desconsideração que supõe ser levada a peito pelos seus ódiaodos políticos de estimação. Como reage o cidadão? Votando pela cara do eleito, ou pelo partido que supostamente representa, convencido que no alto da sua maioridade já sabe tudo de política e democracia que é possível saber, ou que a política consiste em debitar os discursos que ouve na televisão por parte de comentadores mais interessados em mostrar a complexidade artificial e palaciana da ‘política’ que em mostrar a sua simples face, nada afoita um sistema desejável em que cada um estivesse em igualdade de condição para desempenhar um lugar público.

III

Não me canso de o repetir. E a ‘culpa’ também a assumo como minha.

O português não assume frontalmente a culpa. A culpa é sempre do outro a quem confiou a condução da coisa pública. Como tomar a sua República em mãos dá muito trabalho, o nosso sistema político tornou-se a epítome da má fé, isto é, o cidadão sanciona o político que mandato após mandato o decepciona, servindo de bode expiatório para a corrupção da preguiça e negligência do cidadão que o elege. Pode continuar assim o povinho a culpar os outros pela sua inacção. Pode o cidadão dormir à noite com sua consciência vitimizando-se perante o azar de escolher sempre os mesmos abusadores amantes ideológicos, vivemos numa sociedade da sofreguidão pela superioridade moral, onde o político se sente legitimado para mentir e desempenhar a farsa, e o cidadão legitima a farsa porque recebe por isso o sentimento de superioridade moral e de cônjuge encornado, mesmo que isso lhe custe o país, a saúde, a educação e milhares de mortes não contabilizadas por má gestão.

Sentem-se os católicos lusitanos compadecidos com a crónica inexistência de políticos de qualidade quando nunca foi isso que procuraram. Os portugueses apenas procuram políticos sérios e rezam para não os encontrar, que graça perderia a novela se aquele que nos representa fosse um exemplo superior, não poderia eu dormir à noite sentindo-me medíocre em mim mesmo. Ao invés prefiro pensar em portas, coelhos, varas e outros acessórios, que me aparecem como refinados escroques a mim que sou pobrezinho mas honesto e durmo em minha cama descansado enquanto eles passeiam de iate ao fim de semana e comem bom caranguejo. Haverá um católico inferno onde ardam pelas suas acções.

Portugal é a terra da simbiose sinuosa e terrível entre um povo não preparado para viver numa verdadeira democracia virada para promover o bem comum. País de corrupção que constrói um regime político baseado na ilusão, apenas para não ser julgado pelo exterior, afinal o único medo profundo destas gentes, os juízos de fora.

IV

O português vive a prazo, vive o tempo que tem de vida o melhor que lhe seja possível, pois sabe que existe um teatro cósmico em que a segurança e conforto da vida mudam sem que mãos humanas isso possam decidir. Os sulistas católicos, têm a ideia entranhada de participarem numa peça cósmica, mais que desempenhar um papel, e que portanto no infinito do espaço sideral, tudo é relativo e vale mais a pena viver o melhor possível a vidinha que assumir de frente que se está vivo. E o que tudo isso implica.

Não é Portugal que é um país faz de conta, é o povo que faz de conta que é.

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Académicos -parte II

9/24/2013

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Académicos II

I

Falando da minha experiência pessoal, e de acordo com a abertura da época da praxe, que  se prolongará até ao fim do ano lectivo, venho por este meio reflectir sobre esta tradição que é a praxe.

A praxe enquanto tradição é recente e massificou-se com a massificação do ensino superior.

Surge nos contextos suburbanos lisboetas como moda moderna um pouco como a celebração do ‘rookie’  dos filmes de Hollywood enquanto arquétipo do iniciado ou das debutantes do século passado. Lembro-me de ver nos idos anos 90 a sua introdução em contexto do secundário, aplicada aos alunos recém chegados, por parte dos mais velhos, e que partilhava com as praxes actuais a simbiose de entusiasmos entre praxantes e praxados, uns por poder humilhar os outros, e os outros por se sentirem integrados numa brincadeira e num ambiente de amizade fácil, de protecção galinácia por uma espécie de superiores ‘pedagogos’ sobre os trilhos do novo trajecto, sem dúvida com imensos perigos.

Nunca praxei ninguém, fui praxado, e não tenho particular ódio ou amor à praxe académica, mas tenho a minha opinião e nela acho que a praxe é uma idiotice, mas respeito o direito de adesão de cada um, contando que seja voluntário.

Naquilo que supostamente a praxe representa, sou totalmente avesso, até porque por todos os argumentos e mais um, a praxe não serve para integrar, para isso qualquer actividade lúdica cumpriria o ojectivo, a praxe serve para ordenar e hierarquizar. E isso, lamentavelmente, rejeito.

II

Fui praxado por uma cachopa repetente de 2º ano que assim se vingava porventura de aventuras escolares menos felizes, e cuja niilista presença na Faculdade de Letras de Lisboa exigia sentido para o seu trajecto menos conseguido através de um sacrifício ritual de um caloiro.

Calhou-me a mim, que me neguei é certo, pois nunca gostei de me sujeitar a vontades alheias, mas à insistência ameaçadora da musa, fraquejei, confesso, mais por ceder ao mito de que quem se nega é depois renegado por todos os outros sujeitando-se a uma vida de eremita aleivoso, que por encantos intrínsecos da moça. De qualquer maneira, a tatuagem com o nome do meu curso na minha testa, fez-me sentir plenamente integrado e pensei que ao menos assim tinha alguém com quem falar a minha ‘madrinha’ que assim supria a minha falta de baptismo católico.

Com surpresa só a custo conseguia arrancar palavras de minha ‘madrinha’, sempre com ar de oráculo sapiente e milenar, o que de certa forma me fez perceber que as praxes pouco mais são que a repetição mistificada de lugares comuns em que vários interesses e patologias se cruzam.

Não tive uma experiência relevante ou particularmente atribulada, nem sequer ‘negativa’ pelo que julgo estar à vontade para afirmar que a praxe vale mais pela atmosfera alienada e alienizante que projecta que pelas supostas funções de integração e camaradagem. Atenção que não nego a existência das mesmas para pequenas quantidades de pessoas, mas como em tudo as excepções confirmam as regras. O traje académico é outra parte do folclore que surge tardiamente e por osmose em Lisboa (originário do luto académico de Coimbra, bem contextualizado histórica e ideologicamente) , cuja função era mais uma vez travestida, não para identificar membros da Academia, mas para os diferenciar dos comuns mortais como pude comprovar com a minha soberba quando entrei orgulhoso no autocarro, com o nome do curso a vermelho batôn na testa, sentindo-me um eleito.

A meio do percurso senti-me terrivelmente envergonhado por minha pequena e serôdia alegria que saí antes do meu destino para limpar aquela minha falha de carácter.

Com pompa vemos nestas alturas estes placebos de ‘batman’ ou pianistas cangalheiros vestidos ne negro, deambulamdo pelas ruas ou com um grupo de imberbes estudantes em suave perseguição. Conheci muitos colegas que participavam zelosamente nas praxes com um sentido de missão que sempre ultrapassava em intensidade a sua preocupação com as matérias a aprender.

Assisti também à permeabilização da sensibilidade docente para com estas palhaçadas, uns por se sentirem como Maomé perante a montanha, outros porque sabe sempre bem uns dias de folga por causa da tradição académica.

Assisti a suficientes discussões públicas e tomadas de posição de reitores e estudantes, e até às mortes de algumas vítimas de abusos. Cheguei a conhecer as praxes de universidades privadas que faziam da crueldade dos exercícios a liturgia do esforço de equalização da dignidade comparativamente às universidades públicas.

Cheguei a assistir num casamento, perante o olhar embevecido dos pais dos noivos, à cerimónia de celebração que atestava o fim glorioso de um percurso de juventude através de gritos guturais, pandeiretas, piruetas e motes semi brejeiros, que distinguem a elite letrada e bem sucedida do Portugal parolo.

No momento presente, como grande parte dos que já abandonaram os ‘cursos’ ou que já não sentem as hormonas em primaveril desarranjo, olho para estes rituais como cão para vinha vindimada, respeito o direito dos mais novos a celebrarem as tonterias próprias da idade, e não me afecta que os participantes embarquem numa mesma dança vil e suja de subserviência e atavismo chocante.

III

Subserviência porque como já disse, nada há na praxe, a não ser como máscara, que seja integrante. O caloiro integrado não é integrado na faculdade mas na irmandade dos que defendem esta suposta tradição académica. O direito de praxar, é um direito, um direito exclusivo, O veterano não assume o praxado e pós iniciado como seu igual, mas como alguém abaixo numa imaginária hierarquia social e académica. Na praxe, como na tropa, a antiguidade é um posto, e os pobres de espírito não podem dar-se ao luxo de abdicar dos privilégios da posição que julgam ter atingido. Quando ingressei na FCSH, fui abordado carinhosamente por um veterano que me pretendia praxar, pois que havia estado com o radar alerta para novas faces. Repliquei gentilmente que não, ao que o mesmo se despeitou por uma tão grave violação dos seus direitos, pelo que  retorqui indagando qual a legitimação para se poder praxar outro, se era o maior número de matrículas. Não, pelos vistos era a apresentação de um currículo de veterania, que eu não tinha pois nunca tinha praxado ninguém, nem pertencia ao grupo de praxantes da instituição, pois ao que parece só se podem praxar uns aos outros dentro da instituição, o que é uma boa medida protectora, bem como cria uma pequena tribo dentro dos milhares de potenciais servos e escravos do ensino superior deste país.

Demovido pela minha recusa o jovem veterano sentiu que devia retirar-se para alvos mais aquiescentes pelo que fiquei com o meu mau feitio e com a ausência do medo de ficar só para todo o sempre.

 No conjunto das actividades oferecidas numa instituição de ensino superior, a maior adesão envolve sem dúvida e geralmente a tradição praxista e como complemento vitamínico, as tunas.

Não é possível a alguém de boa fé negar que existem interesses próprios ou ganhos individuais nesta promoção de actividades. Se sujeito X opta por participar a expensas próprias no teatro da praxe é porque ganha algo com isso. Sejam vantagens a nível sexual (conhecer caloiras e caloiros e aparecer aos olhos de potenciais parceiros como alguém integrado e proactivo(a) ), sejam vantagens a nível psicológico, com a humilhação ou na melhor das hipóteses, no fascínio ou domínio exercido em outros mais impressionáveis. É claro que existem os caso de pessoas que acham genuinamente que através da praxe prestam um exercício ao próximo, mas pede-se apenas um pouco de honestidade para admitir, que se toda a gente que participa o fizesse por motivos altruístas, tínhamos todos os flagelos sociais portugueses resolvidos À base de caridade, a não ser que a imagem de um caloiro indefeso a entrar pela sombria e fantasmagórica entrada de uma universidade seja mais comovente que um desgraçado sem abrigo toxicodependente em coma alcoólico morando numa lixeira. Passo o exemplo.

Pessoalmente não acredito no argumento falacioso do altruísmo, tal como menos acredito no argumento a favor da manutenção desta tradição veneranda com menos de meio século de longevidade, que contextualizada a Lisboa, nem 30 aninhos deve estar a fazer.

Se toda a população do ensino superior se dedicasse de igual forma a todas as formas de preservação da memória cultural, teríamos núcleos de ranchos folclóricos e até de horto fruticultura em todas as universidades portuguesas. Passo o exemplo.

As palavras bonitas acerca das praxes são apenas isso, palavras bonitas para disfarçar o óbvio.

IV

Como já referi, a praxe implica uma sujeição entre membros de dignidade ou posição diferente, o que implica a aceitação dessa diferença, hierárquica.

É portanto uma actividade classista, parola e conformadora, que na minha opinião aliena e restringe o que de mais valioso se encontra na sociedade civil, a irreverência e força de esperança da juventude.

Praticada pelos jovens estudantes, que em casa recebem o ensinamento de uma sociedade dividida em ordens, dignidades, classes. Conforme à visão de alguns, é certo, mas terrivelmente serôdia no sentido de que aceitar a diferença ou seriação dos seres humanos em nós e eles, vai tão contra a propagada ideia de que somos todos iguais, como as difenrenças de ordenados para diferentes funções igualmente importantes.

O jovem licenciado sai com a praxe, mais conformado e conformador, que aquilo que é desejável. Sai do seu cursinho a acreditar que a paciência e a resignação, que a aceitação de ordens, que a subserviência fazem parte de um trajecto normal que culmina no prémio que ele ou ela anseiam.


É curioso como se defende por vezes a actividade desinteressada da praxe, baseada na integração dos novos alunos. Dá a ideia de que os veteranos são dedicados filantropos da harmonia universitária, o que de certa forma com a estratificação que desde o início se ensina aos caloiros, que têm de aprender a diferença entre caloiros, doutores, padrinhos, e restante parafernalia de nomes e rituais que se podem observar na praxe - e experimente-se abordar um destes veteranos, geralmente respondem com alguma aridez para quem não conhecem dentro do recinto escolar, aridez acentuada se for um caloiro a quem é preciso vincar a autoridade.

Cada doutor deve ser recompensado pelo montante gasto em fardas / uniformes, a bem do bem estar e acolhimento dos outros. Podemos até criar a ideia de uma universidade amistosa e plenamente porreiraça à conta destes veteranos dos livros, mas o que acontece a maior parte das vezes é que são criaturas classistas, elitistas e exibicionistas, em particular com o seu negro uniforme que os distingue dos demais.

Relembro uma tradição académica bem mais antiga e infelizmente que se vai perdendo, na Faculdade de Letras de Lisboa, em que não se utilizava o traje académico, e onde os caloiros eram convidados para beber cerveja, em igualdade, com os alunos mais velhos e os temas de conversa eram invariavelmente os assuntos que iriam tratar no decurso da sua aprendizagem, na instituição e fora dela. Quer porque esta veneranda tradição não cria senão um sentimento de partilha e camaradagem, vai-se perdendo para as ridículas tarefas de infantilização e pornografia de brincadeira que se escutam um pouco por toda a cidade. Nelas é invariavelmente observado um mandante e um executor, uma autoridade e uma submissão, sob todos os eufemismos que se queiram evocar para amenizar esta crua leitura.

No fundo a praxe é a institucionalização da violência sobre o outro através de uma manifestação imberbe e infantil, praxar é brincar ao reizinho e aos estudos, é fazer dos universitários pequenas crianças tiranas a brincar aos adultos.


Assim é a praxe uma actividade conservadora e socialmente regressiva, além de eticamente questionável.

Mas como é práxis, fica ao cuidado do comprador, Caveat Emptor.

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Desvanecendo

9/15/2013

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Dia mil do protectorado estrangeiro no meu país.

Continua a sangria de gente jovem e formada para além fronteiras em vagas que se repetem pelos séculos.

Vou trabalhar e pela autoestrada ligo o rádio e escuto uma voz difundindo a sua mensagem religiosa que envolve um apelo propagandístico às benesses na liberdade de ensino e do papel do Estado. Que mania esta dos religiosos se meterem em política. Segundo essa voz, a liberdade de educar os filhos conforme a vontade dos pais de acordo com uma opção pelo contexto ensinado nas escolas, obriga a que o Estado financie as escolas privadas, em nome da liberdade.

Ficamos a saber duas coisas, que a matéria tão fundamental pode ser ensinada de formas distintas, como se as Matemáticas do Crato fossem passíveis de interpretação ideológica, e que ‘liberdade’ passa por ir a um restaurante e pedir um prato que não está no menu.

Ou seja, o cidadão paga a educação, mas na hora de escolher escolhe outra forma de educação e o Estado tem de pactuar, numa engraçada ideia de escola pública, mais ágil, mais adequada aos sabores das modas e caprichos dos encarregados de educação.

Daqui a uns anos não podemos senão esperar que cada família faça a educação da sua criança à sua medida, uma escola  a la carte.

A escola pública não visa formar consumidores, visa formar cidadãos.  É sumamente curioso que as forças políticas que gostam de normalizar e dividir tudo socialmente são aquelas que vem afinal dizer que todos devem ter uma educação diferente. E que liberdade passa por poder escolher mais que uma marca de pasta dentífrica de uma prateleira de supermercado.

Mais curioso ainda que da Igreja ainda venham estas ideias e propostas, não exactamente por recriação própria mas apropriando-se da onda argumentativa actual.

É o tempo dos argumentos, ao serviço de quem os profere. A lógica retorcida ao sabor das vontades torna impossível o discurso. Não é possível encurralar um sofista a partir do debate racional, objectivo. Os sofistas lutam sujo, não por mor de chegar a uma conclusão e a uma eficiência de processos, mas por conseguirem levar a água ao seu moínho.

Torna-se perplexo o espectador que analisando os vitupérios, escuta o escarnecer dos sistemas de esquerda e mutualização da propriedade, sob epítetos de ‘falta de liberdade’ e ‘propaganda’ ou ‘censura’.

Que outra coisa não é a lógica inquinada ao serviço de uma visão do mundo, senão propaganda?

Que outra coisa não é o provincianismo português senão a adesão acrítica a ideias feitas e a total demissão de um projecto autónomo enquanto cultura?

A manipulação da linguagem é total ante uma população imbecilizada entre telenovelas e futebol e que se prepara para legitimar de novo os inaptos do costume.

Que se pode dizer de um sistema onde os piores decidem o destino dos mais esclarecidos? Que dizer de um sistema onde indigência argumentativa e a má fé são a base das tomadas de decisão? Portugal é uma jangada de pedra à deriva desde a sua fundação, o orgulho de uma autonomia só se evidenciou nos momentos históricos em que a solidão do virar costas ao continente sempre foi uma opção alheia, logo forçada, logo não opção.

O esforço passado em sangue e opções estratégicas da nossa política externa, foi completamente desbaratado ante as submissões consecutivas através de acordos não sufragados politicamente, pagos a peso de outro pela eurocracia.

Não há que censurar estas pessoas que optam pela extinção da entidade geo política ‘Portugal’.

Há que perceber que são consequência da sociedade que deixámos construir nos últimos 40 anos. A geração presente, a que decide, é ‘europeísta’, ‘globalista’ e cosmopolita. Na minha opinião é fatalmente ingénua, mas tomo essa ingenuidade como consequência de grande parte dos nossos decisores terem sido criados numa sociedade corrupta, promotora dos espertos, e completamente acéfala no que concerne à adesão a modos de vida e mundividências externas.

Contra o provincianismo, e contra a criação endémica de traidores sem o saberem,  o único paliativo é a educação. Com a redução do papel do Estado, reduz-se também a sombra da pátria, a visibilidade de um projecto nacional, que se encontra em suspenso de mais uma região ultraperiférica de um aborto chamado União Europeia. Portugal é ultraperiferia, e quanto mais portuguesinhos nos sentimos mais nos queremos sentir cidadãos do mundo, cosmopolitas, participantes de uma Europa, na qual nada temos a dizer que decida, após os sucessivos tratados assinados por traidores profissionais.

Não é possível evitar a corrupção pós revolucionária, sem ser com um Estado ditatorial. Isto porque os cidadãos vão sempre querer obter vantagem ou evidência uns em relação aos outros, e a nossa única forma de evitar isso seria uma educação pública para a República, não para uma pseudo democracia sem sabor e refinada por ideias de politicamente correcto, mas que evidenciasse o que custa e o que está envolvido numa sociedade igualitária e independente.

Urge um apelo às armas e à violência, bem como à desobediência civil. Não porque sejam respostas a alguma coisa, mas porque infelizmente não há mais nada que possa obrigar a população a parar e a pensar, numa reformulação da sociedade em que se deixou cair. Não defendo a violência mas neste momento é mais violenta a inacção que uma sublevação geral.
Se nada for feito além de calma submissão, os problemas vão-se avolumar e não desaparecer, estamos todos a fingir que não vemos o elefante na loja de loiças.
É imperioso resistir e apelar ao bloqueio global do país, mesmo que aumente uma divída que já por si é impagável. é necessário sovar e organizar acções violentas e concertads contra as personalidades que representam o regime. O episódio Relvas homenageado no Brasil, não foi importante por causa do caricato da situação do falseador, e da sua celebração, mas sim por podermos observar em directo os sorrisos amarelos dos colunáveis que iam acedendo ao recinto. Gente qua nunca passou necessidades na vida e para eles este é o melhor sistema possível, cada um merece o que tem, começando por eles, os risos de superioridade e pretensa civilidade reflectem uma forma de encarar o mundo que coloca antagonismo insanável entre conservadores e revolucionários. Os nossos aldrabões e inaptos governantes vivem numa redoma própria, num mundo de justificação actualizada no qual quase tudo faz sentido. Vivem na lua portanto, e é esse fundamentalismo que os torna perigosos.
Ao fundamentalismo terrorista, não há resposta passível de apelar além de uma lógica inquinada, de facção. Não se consegue convencer os conservadores da necessidade revolucionária enquanto as pessoas acharem que existe algo a perder.
Não há pois diálogo entre facções, não há acordos, apenas a suspeita de que só através do empobrecimento geral da maioria, se pode voltar a calibrar, temporariamente de novo, a nossa sociedade. E destes avanços e recuos se faz a nossa História.

Portugal é aquilo que pode e deve fazer de si mesmo. Abdicar deste carácter aberto de possibilidade, de potência, é abdicar da nossa identidade, além de selecções de futebol ou de galos de Barcelos e pasteis de nata.

O desfile de inaptidão que nas últimas décadas é observável na pasta da Educação, nao é fortuito senão sistematico. Creio assim que com a vergonhosa complacência da população portuguesa, estamos a liquidar as últimas raízes que prendiam o último dente à gengiva.

Não por culpa do senhor Crato, mas mais uma vez daqueles que caem nos discursos de lógica enviesada do ‘rigor’ da ‘avaliação’ do combate ao facilitismo, que são conceitos repetidos até à exaustão que lhes retira qualquer sentido além de serem ideias feitas.

O senhor Crato no seu discurso inaugural no Parlamento revelou a profunda indigência cultural que detêm, especialmente no que concerne à ordenação dos saberes científicos.

Não é mau rapaz, apenas se meteu em bicos dos pés numa tertúlia televisiva com o senhor Crespo e com o senhor Medina Carreira, numa espécie de dialéctica dos Marretas, no que concerne ao malhar nos erros daqueles que criticavam. Discursos com ouvidos atentos e nada melhor que colocar gente que o povinho aprecia para ganhar o tempo suficiente para tanta coisa a desmantelar.

Com bolos se enganam tolos e o último dente está quase a cair, resta também comer a sopa que nos vão dar, até ao dia de finados em que recordaremos uma pátria que foi Portugal.

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Tra(d)ição

9/7/2013

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Segundo documento que se pode consultar no website do Parlamento português, e cujo cabeçalho a seguir se transcreve:

«1

Crimes de Responsabilidade dos Titulares de Cargos Políticos

Lei n.º 34/87, de 16 de Julho,com as alterações introduzidas pela Lei n.º108/2001, de 28 de novembro,Lei n.º 30/2008, de 10 de Julho, Lei n.º41/2010, de 3 de setembro,Lei n.º 4/2011, de 16 de fevereiro, e Lei n.º 4/2013, de 14 de janeiro (retificada pela Declaração de Retificação n.º 5 /2013, de 25 de Janeiro)

Artigo 7.º

Traição à Pátria

O titular de cargo político que, com flagrante desvio ou abuso das suas funções ou com grave violação dos inerentes deveres, ainda que por meio não violento nem de ameaça de violência, tentar separar da Mãe-Pátria, ou entregar a país estrangeiro, ou submeter a soberania estrangeira, o todo ou uma parte do território português, ofender ou puser em perigo a independência do País será punido com prisão de dez a quinze anos. »

 

I

 

Qualquer tasca do nosso país apresenta um ruído de fundo de pessoas a falar, e onde invariavelmente e com a regularidade de um metrónomo se pode ouvir a acusação de ‘traidor à pátria’ no que concerne a elementos da classe política, a maior parte das vezes à generalidade da classe política. O português, talvez com razão, encara a ´política’ um pouco como o português medieval encarava a corte, uma espécie de novela distante, onde os ricos e importantes decidem a vida de todos os outros essencialmente quando se fazem sentir tais decisões no dia a dia.

 

Qualquer pessoa acha os assuntos da coisa pública como coisa enfadonha e chata e prefere delegar a uma classe especial de madraços e aldrabões, que admira em segredo, os políticos. Admira em segredo porque os portugueses tem como maior tradição, não o pastel de nata, o bacalhau à Brás ou a saudade, mas a admiração pela esperteza.

A esperteza aparenta ser uma espécie de inteligência de curto prazo, ou inteligência aplicada. Não é inteligência pois a mesma implica eficiência, e nada de curto prazo é eficiente, nem a sua aplicação por si só se situa apenas no plano material.

 

Mas o português adora os espertos ainda que lhe façam mal, um pouco como o infeliz exemplo no qual a mulher admira o homem que lhe bate porque lhe reconhece masculinidade na acção.

No caso do político português não é a violência a céu aberto, isto é a chapada forte e feia, que enfeitiça os concidadãos. È a falta de vergonha, uma quase afronta com que o político agride, e a frontalidade com que o faz, levando à ribalta uma classe de sem vergonhas convictos que a generalidade da população acarinha de quatro em quatro anos na armadilha que lhe foi montada por estes hábeis filhos do povo.

 

Portugal, o país inovador dos autarcas-bandidos, faz parte do mundo ocidental em que a iliteracia e analfabetismo pop fazem escola, e perante este ponto de vista, temos razão para temer por uma implementação futura da democracia. Chamar democracia a uma palhaçada que se organiza de 4 em 4 anos, é um exercício que ganha seriedade quando se analisa os cartazes deste 2013 dos candidatos políticos aos orgãos de poder, nomeadamente com a manipulação de imagem, com as faces cândidas ou mangas arregaçadas, e frases sonantes que tentam projectar uma intenção de fazer muito pelo votante, ainda que o votante nada perceba do que seja o que se vai fazer.

Para o votante dá a sensação de que o fazer seja as tais coisas chatas que não quer saber e delega a outros para fazer, bem como se projecta uma espécie de novela onde cada candidato se apresenta como São Jorge contra o dragão, sendo o dragão a metáfora das forças de bloqueio que impedem uma acção construtiva e moralizadora do respectivo candidato.

Nos actos eleitorais anteriores, as referências ao partido ocupavam cerca de 50% do espaço total, e este ano como a popularidade dos partidos está baixa, notam-se uns pequenos símbolos e há uma maior projecção de marketing a partir do próprio sujeito que se candidata, numa clara e vergonhosa acção comercial, claramente tradicional de ‘trabalhar de acordo para onde sopra o vento’.

 

Da anterior definição de traição à pátria, podemos retirar algumas noções, nomeadamente que é apenas ao titular que pode ser imputada responsabilidade nos actos de:

a)      Tentar separar a Mãe-Pátria

b)      Alienar a independência ou auto-determinação do próprio destino, para com poderes estrangeiros.

De acordo com a lei, ainda vigente, é traidor não apenas o político, como o cidadão comum (lamentável que tenhamos de fazer esta distinção), que tenta separar física ou de outra forma a entidade geo-histórica designada por ‘pátria’, e reduzir a soberania e auto-determinação da mole de indivíduos que compõe essa entidade geo-histórica.

II

 

Daniel Campelo, Fernando Gomes, Alberto João Jardim, Mota Amaral (veja-se os casos caricatos da Frente de Libertação dos Açores e da Frente de Libertação do Arquipélago da Madeira), Nuno Cardoso e outros, são figuras públicas que sempre podemos ver em órgãos de comunicação social denunciando contra o centralismo de Lisboa e por vezes ameaçando com indepência da suposta unidade regional de que se dizem representantes.

Coloca-se a questão sobre se isto é ou não um crime de traição na medida em que a criação e manipulação de discursos divisionistas, especialmente com a criação artificial de micro entidades geo-históricas, contribui para uma cisão no corpo de cidadãos da República.

Grande parte da elaboração destes discursos serve a finalidade de sugar mais leite da teta da vaca, leia-se, conseguir mais financiamento a partir de uma administração central.

Dos exemplos dados anteriormente, só Nuno Cardoso não beneficiou porque não foi eleito, todos conseguiram ou lugares cimeiros no aparelho público, ou financiamento para perpetuação de mandatos. Ou seja, sob determinado ponto de vista, Portugal paga para manter a sua integridade territorial.

Se essa integridade tem de ser paga, não é integridade. Se os portugueses querem um país, e podem legitimamente não o querer, essa vontade tem um custo. O custo é um desígnio comum, e a tomada de decisões que possibilitem esse desígnio comum.

É possível organizar discursos separatistas ao nível da freguesia. O peso da centralidade faz-se sentir não na auto afirmação da entidade regional, mas numa suposta apropriação indevida da capital em relação ao todo, o que não passa de uma deturpação do facto de que a má gestão política e territorial que empobrece todo o país por igual.

A responsabilidade disto é portanto repartida por cidadão e decisor por igual, pois um legitima o outro, o cidadão ao sufragar o seu representante através de uma cruz e da aceitação do discurso divisionista, ou outro aproveitando-se na inevitabilidade da manutenção do aparelho público corrupto e apelando ao mesquinho sentimento de diferenciação entre aldeias e ao inimigo centralista, para poder usufruir da confiança do eleitorado.

Tome-se o caso exemplar da Região Autónoma da Madeira, que ao longo do longo reinado do seu Presidente, revela a postura da população insular em relação à população continental, em particular de Lisboa, pois se continuamente se elege um homem que insulta e desconsidera os seus compatriotas discriminando-os de acordo com a sua localização geográfica, só se pode considerar que essa desconsideração é aprovada pela maioria que o elege.

III

 

A nosso ver, uma grande causa deste estado de coisas decorre da implementação de um preconceito provinciano contra o nacionalismo e o sentimento nacional, assenta em dois polos, a) a fraquíssima qualidade da nossa República decorre directamente da fraquíssima qualidade na educação do cidadão, educado para ser funcionário mas não cidadão de uma República, e b) da estrutura politico-social que beneficia com a estupidificação da população e com a manutenção de um estado de pulverização de toda a realidade social, leia-se o poder local, e na sombra, os partidos que a partir do poder local esperam obter dividendos no acesso ao poder.

Se neste segundo ponto seria vital impedir o titular do cargo político usufruir durante e depois do seu mandato de qualquer benefício profissional ou de outro tipo, no primeiro, torna-se complicado aferir a partir da qualificação sem precedente, a nivel académico, dos titulares hodiernos de cargos políticos, como essa qualificação contribui ainda para a articulação miserável do empobrecimento metódico da nossa nação.

Ou seja, como é que na geração mais formada academicamente que Portugal já conheceu, temos tanta gente a trabalhar para dissolver o país?

Uma abordagem seria correctamente afirmar que grande parte dos que trabalham para a desintegração, não o sabem, pensam que trabalham ao serviço de Portugal.

Outra é afirmar que interessa a desintegração nacional, pois a inserção na mais vasta unidade narcótica denominada de «união europeia», permite um coma administrativo no qual os dividendos pessoais compensam a acção de subtracção de autonomia nacional.

A outra, bem mais sinistra, implica uma coacção ideológica que identifica o nacionalismo com estereotipos racistas e fascistas, e não apenas como amor à unidade geo-histórica na qual o sujeito se insere.

Este rejeitar da ideologia é ideologia também. Assim se pode compreender como a maior parte das pessoas formadas sejam destituídas de algum sentimento gregário ou nacionalista, em parte porque cresceram numa cultura que fomentou o egoísmo e a acção norteada pela competição, em parte porque mercê da importância social vã do titular do curso superior, se alimenta uma postura em que esse mesmo titular se acha capaz de possuir uma opinião bem fundamentada e inatacável no que concerne a uma postura ideológica.

Qualquer engenheiro de sapataria se considera apto a debater o que for, apenas porque cursou durante 3, 5 ou 10 anos algo que se designa de ‘superior’ e porque foi avaliado num processo que concluído lhe faz merecer consideração social, na exacta proporção em que o seu curso é aceite no mercado de trabalho ou defendido por órgãos de pressão anti patriotas como é exemplo a Ordem dos Médicos.

A rejeição da ideologia é uma tomada de posição ideológica.

 

 

 

 

 

IV

                          Portugal está refém de uma classe social, que ganha na manutenção de uma autonomia mitigada, perto da extinção nacional. Tal como o emigrante que fala português em França e francês em Portugal, o político, o cidadão deslumbrado com o estrangeiro, que compra mugs de café em New York, ou bebe uma pint no Soho, ou passeia pelos Champs-Élyseés, precisam do choque de culturas, dentro da cultura globalista, para chamarem a si uma diferenciação lisonjeira.

O hodierno cidadão suburbano português de classe media considera-se um cidadão do mundo, identificando o mundo com os lugares que já visitou segundo a agência de viagens. Abraça mais a alteridade cultural que conhece superficialmente que a mesmidade cultural que renega e não conhece ou imagina. O cidadão que celebra as suas bodas na República Dominicana e nunca visitou o Gerês, ou tentou calcorrear todas as ruas de Portalegre.

Assim, a nossa geração mais formada e a-ideóloga, contribui para a manutenção de um sistema que no caso presente a força a largar o torrão pátrio.

Mais uma vez, em virtude do sistema social e administrativo, Portugal rejeita o progresso, expulsando os elementos que pagou para formar e que vão privilegiar outras nações, e mantém a mesma escória que acentuou o atavismo social que presenciamos.

Assim, o humilde cidadão de freguesia rural dos confins nacionais, ou o cosmopolita doutor ou engenheiro emigrados, fazem parte da mesma moeda, ainda que um só se lembre da existência de um país chamado Portugal, quando descobre que a sua freguesia por si só não angaria dinheiro suficiente para a construção de mais uma estrada que a ligue ao hipermercado mais próximo, ou quando emigrado o doutor e engenheiro sente saudades de casa e do pantâno que abandonou, obrigado por motivos económicos, suspira pelas férias de Verão para tornar ao país que finalmente passou a valorizar mais que os postais e as fotos que coleccionou nas suas viagens anteriores de locais distintos ou famosos.

V

 

                          É complicado verificar uma saída deste atavismo sem medidas demagógicas ou sem ser em contexto revolucionário.

Sobre o contexto revolucionário, dificilmente se farão alterações eficientes de forma política, não porque não seja possível fazer uma revolução sem derramar sangue, mas porque se esperarmos alteração por parte de quem se interessa que nada mude, não é ingenidade, é estupidez.

Infelizmente, acreditamos que passámos o ponto de não retorno para uma acção violenta em contexto de guerra civil como forma de alterar o jogo político nacional. O país é administrado por corruptos que utilizarão todos os meios ao seu alcance para poderem usufruir dos motivos que os levaram a corromper. Desde que se instituiu esta ‘democracia’ que a presença da lei não faz da lei uma presença, isto é, o corpo legal apenas serve para dar a ilusão de um Estado de direito, quando as relações de entrelinhas condicionam invarialvelmente o contexto de crime e castigo.

O caso flagrante dos incêndios florestais e da corrupção descarada em seu torno ou o do financiamento público do ensino privado responsabilidade do senhor Nuno Crato, até podiam ser tornados crime público, que o são, mas quem vai condenar alguém nesta república bananeira, onde a lei existe para ser feita excepção? Onde a maioria dos magistrados estão conotados com organizações particulares, como sejam os partidos políticos, para dar um exemplo mais visível?

É realmente um mundo faz de conta, ou de como diz o vulgo, ‘para inglês ver’ e é isto um reflexo da já citada cultura da esperteza.

Devemos pois considerar esta geração perdida, e ter esperança num desenlace revolucionário diferente do de Abril de 1974, que mais não foi que um movimento apropriado, manipulado e atraiçoado, e que devemos tomar como exemplo e aviso.

Isto porque dificilmente se mudam as mentalidades de um momento para o outro.

Podemos sim criar as condições para que a geração que se segue construa uma sociedade melhor que a nossa. Ou então que se extinga o que tanto custou a conseguir, Portugal.

Quando um país mais não consegue produzir que heróis de circunstância no futebol, ou convictos cobardes e traidores, ou quando um país obriga a maior parte da sua juventude ciclicamente a emigrar, é altura para que se pense se esse país não é um país falhado.

Quando um país produz mais oportunistas e divisionistas, que bem estar geral, é questão para se perguntar, se não devemos fechar a porta e sermos outra coisa qualquer, desprezando a lei das aparências, que é a única coisa hoje em dia que faz com que ainda gostemos de dizer que temos um país.

VI

 

Por onde podemos começar?

A criação de algo de novo que melhore o que já se conseguiu anteriormente é um processo dialéctico comunitário.

Urgem várias medidas, nomeadamente

a)de carácter económico com proteccionismo doloroso à economia baseada na produção nacional de qualidade e não na mão de obra barata como tem sido feita até aqui. Isto pode implicar a saída do Euro e a revitalização das fronteiras. Os mais importantes bens de consumo devem ser produzidos em Portugal, com respeito pelos interesses de outras nações investidos em Portugal, mas submetidos ao que o Novo Parlamento designar como interesse nacional.

Um caso exemplar é a negociação dos direitos petrolíferos na costa algarvia que deve ser tomado como exemplo de acção de alienação do património comum, para benefício de alguns.

Se há investimento estrangeiro em Portugal é porque de alguma forma é rentável, se é rentável para outros também deve ser rentável para ‘nós’. Este ‘nós’ implicará desmistificar a ideia de que no sector público é tudo corrupção, e má gestão, quando se evidencia que um punhado de trabalhadores maquinistas da CP ganham x ou y, mas pouco se ouve falar da fantástica gestão do hospital Amadora-Sintra.

A economia tem de ser nacionalizada.

A interdependência alegadamente associada à globalização é apenas uma cortina de fumo que ofusca a imagem de um mundo que se divide entre economias fortes e dominadoras em clima de guerra económica, e economias raquitícas condenadas a exportar matéria prima ou a facultar mão de obra barata.

b)implementação de uma sociedade igualitária do conhecimento, ou seja, aproveitar a geração de gente formada que emigrou ou não, dando-lhe as condições de exercer e desenvolver as suas àreas de formação.

Devemo-nos apoiar nesta mesma geração para implementar uma intervenção, se necessário violenta, de molde a reformular as estruturas vigentes, e a implementar uma economia baseada nos recursos e não na lei de mercado.

Só assim se cria o alívio existencial para os nossos técnicos se tornarem criativos nas àreas estratégicas que o Novo Parlamento decidir para o nosso país.

A desigualdade social tem de ser denunciada como estando na base de uma cultura da imagem e do privilégio, ao qual subjaz uma lei da propriedade que promove o calamitismo quer no planeamento quer na execução de projectos nacionais de interesse comum.

Ordenados iguais para todos, dignidade igual para todas as profissões, e erradicação da cultura da imagem, bem como limitação da propaganda consumista que conforma as mentalidades.

c)planeamento de uma estrutura punitiva para com os responsáveis por crimes de lesa pátria, com a criação de grupos de trabalho de aferição de enriquecimento ilícito e tráfico de influências com punição que implique nacionalização dos bens e implementação do ostracismo e perda da nacionalidade portuguesa para os criminosos, além de purgar todo o actual Velho Parlamento, acabar com as regalias dos políticos, desde logo obrigando a rotatividade obrigatória nas funções administrativas do Estado, bem como a criminalização da falta de comparência em actos de gestão comunitária, criando uma atmosfera de frugalidade na qual só se torna ‘político’ aquele que realmente tiver interesse em desempenhar esforço para bem de outros.

Tornar obrigatória a formação académica e profissional, a todos os cidadãos nacionais, de modo a que qualquer um no pleno usufruto das suas capacidades possa ser colocado ao serviço voluntário de todos. O ensino privado deve poder coexistir, mas sem qualquer ajuda do Estado.

Deve ser criado desde já um Conselho da Revolução que faça um plano da guerra civil a concretizar-se, e das novas formas de governo e de administração que fundamentarão uma nova sociedade, desde logo identificando os alvos, os meios e a estratégia de uma insurreição armada e da base legal estruturada em novos juízes, que oblitere por completo qualquer processo contrarevolucionário, como é habitual nestas condições.

Deve ser instaurada em cada cidade portuguesa uma guilhotina com motor trifásico, e utilizado o sangue decorrente das purgas para rega para produtos agrícolas para exportação, uma vez que se for criminalizado o crime de traição à Pátria, com a pena de morte, tememos que Portugal acelere o processo de auto destruição e fiquemos de um momento para o outro sem habitantes.

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Ritmos da propriedade

8/11/2013

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I


Os desenvolvimentos últimos do pântano que há 39 anos se chama 'democracia portuguesa' levam a crêr que a continuidade política pode passar por um caminho de convulsão e confusão análogo ao da Grécia.
Se há algo que se pode observar nas últimas erupções sociais televisionáveis ocorridas um pouco por todo o planeta, é o saneamento mediático e reaccionário de todas essas manifestações sociais.
Qualquer abafamento dessas erupções só ocorre quando o regime que se impõe é mais cruel, ou por outras palavras, mais assertivo que o deposto. No centro desta dinâmica está sempre a mesma questão.

A propriedade.
Geralmente as forças conservadoras trabalham em surdina e com um uso eficientíssimo da propaganda. Portugal não é excepção.
É a partir da lei da propriedade que se organiza a estrutura social, que pode ser hierarquizada ou hierarquizada com sabor a canela, como no caso português.

A origem da desigualdade entre os portugueses não radica na fortuna genética de uns em relação a outros, ou de uma meritocracia da esperteza, mas radica sim na perversa lei da propriedade.

A acumulação de riqueza, capital, propriedade imóvel, etc.detém a génese para a desigualdade social, ergo para a existência de uma sociedade classista. Há pelo menos quatro factores de resistência à nacionalização da propriedade de alguns para o bem geral:

1) a crença de que o esforço individual merece a recompensa de bem estar material só possível através da acumulação de valor. Muito boa gente acredita que é a ambição pessoal que conquista os supostos sucessos civilizacionais. Que é a ganância e não a cooperação que promove o desenvolvimento tecnológico das sociedades. O registo arqueológico não mostra isso. Longe vai o tempo do difusionismo. O mercado global desde os Descobrimentos, como todo o comércio de bens, obedece às leis de oferta e procura e portanto, baseia-se num pressuposto de escassez. Esse pressuposto é regra geral de índole espacial, e não psicológica, portanto a geração de valor não ocorre quando um sujeito não consegue estar quieto e tem uma ideia de negócio, mas precisamente por aproveitar as condições de escassez de determinado bem que só o é de acordo com a sua menor disponibilidade. Pensar que sem a ambição pessoal os sujeitos se deitariam todo o dia de barriga para o ar, é uma ficção tão grande como aquela que sustenta que é pelas trocas comerciais baseadas em economias de carência se evitam os conflitos armados entre as sociedades.
Se por fantasia aceitamos o factor da ambição pessoal no progresso de uma comunidade,  devemos aceitar a desigualdade porque 'essa' pessoa se esforçou e merece por isso viver uma vida materialmente melhor que as restantes? Os exemplos anedóticos de que 'se eu  fizer uma horta e outro quiser colher os frutos do meu trabalho' só revelam a tal aceitação implícita de que a) a malta sem coerção não faz nenhum, e b) numa sociedade não capitalista as únicas escolhas são o marasmo ou a miséria.
Se a horta for comunitária, não será possível dividir quer os proventos, quer os esforços?
A acumulação de valor pelo sujeito só concede mais valia para o mesmo se o 'produto' for relativamente escasso, portanto os chamados hoje de 'empreendedores' são aqueles que só podem sobreviver onde há miséria, ou pelo menos escassez de oferta. Os neoliberais reformulam a linguagem e dizem que o 'empreendedor' sucede onde há abundância de oportunidades.

2)Na base disto está outra ideia feita, a de que a desigualdade social deve recompensar aqueles que conseguem ser mais espertos, dinâmicos que os outros. Eu mereço ter um Porshe e um Ferrari porque descobri um nicho de mercado onde posso vender tshirts personalizadas, fui esperto, soube ler o mercado, numa lógica meritocrática que em Portugal tem uma maioria de fãs, que paradoxalmente nos cafés se queixam da chico esperteza dos seus concidadãos como factor de desprezo e atraso. Na base desta mundividência está a prevalência de um objectivo de vida que leva como mote 'uma boa vida' em detrimento de 'uma vida boa' isto é, é por o sujeito pensar que o que interessa é esta vida e tirar o máximo dela, que sustenta o modo de olhar as coisas de forma acrítica e acelerada tendo como referente uma visão hedonista e limitada de si mesmo e dos outros. Muitos sustentam que o senhor Belmiro de Azevedo e outros merecem a pornográfica riqueza que têm porque foram mais espertos que a concorrência, e que por tal não interessa olhar para os contextos dessa aquisição mas apenas para o resultado final. Até porque dão muitos empregos e portanto estão gradativamente entre anjos e santos.
Há uma certa dose de ingenuidade nestas duas  posturas, que implica uma crença de que é a esperteza e o esforço que fundamentam a acumulação de riqueza, e portanto a riqueza material que se crê ser a fonte de felicidade na vida.
Há muito boa gente que acredita que  o senhor Abrahmovic é um iluminado porque soube gerir e aumentar a sua fortuna a partir dos patinhos de borracha que começou a vender de porta a porta.
Muitos pequenos e médios empresários dão o seu exemplo, de esforço e abnegação, 'para terem mais alguma coisinha' como mais horas de trabalho que os outros, mais sacrifícios e riscos, e que portanto todo o conforto material que possam ter lhes é devido porque o pagaram com suor. A maior parte dos pequenos e médios empresários nacionais, vivem de pequenos expedientes e migalhas, deixados por grupos económicos a quem não compensa determinado teatro de operações e a quem convém a luta pelos preços e a dependência que 'os pequeninos' travam para poderem ter fluxo de trabalho sob as grandes corporações. Outro factor que leva trabalhadores a quererem ser empresários é não terem de se sujeitar à má gestão crónica de patrões, que em Portugal é um recurso abundante, e que por isso, por causa da mentalidade de querer ser patrão, cria a perpetuação de má gestão empresarial, bem como o marasmo reivindicativo que é factor de estagnação tecnológica e social.


3) Se se nacionalizarem os recursos ai meu Deus que cai o Carmo e a Trindade, é a crença de que o Estado é mau gestor. Esta crença radica na primeira, pois sustenta que no Estado os trabalhadores são todos uns madraços porque não têm um patrão a morder-lhes as canelas.
Pelos vistos o dinamismo só funciona em ambientes coercivos, e a tendência biológica de poupança de energia, é contra as necessidades do mercado, logo a natureza é nossa inimiga, excepto quando utilizada para vender. Tornar determinados recursos a uma posse comum e garanti-los a toda a população alivia a carga coerciva de 'viver' o que até pode aumentar a produtividade, longevidade, e diminuir os custos com a saúde pública, dizem alguns. Outros dizem que a boa gestão dos recursos, só é possível através da gestão privada, pois o patrão não quer perder lucro ou os recursos explorados, e como já vimos, os espertos, e os esforçados têm de ser recompensados pelo seu dinamismo. Não se percebe porque é que ninguém ainda se lembrou de colocar umas ventoínhas cobertas por lençóis na Avenida da Liberdade, com modelos femininos fazendo campanhas de charme para venda de vias verdes que se colem na testa, para os transeuntes daquela zona que passeiam e pagam portagem possam usufruir de ar mais limpo e filtrado.
Ou seja, a privatização e exploração de bens essenciais para a vida normal do cidadão deve ser considerada como artificial e perniciosa, pois com determinado conjunto de regras ou leis, também eu sei ser um magnata dos negócios.

4)O medo do papão por fim, é o factor que mais entranhadamente habita a ideia dos homens contemporâneos.
O Estado gere mal, os que querem nacionalizar são uns malandros e eu sou tão mais feliz quanto mais liberdade tenho, e por liberdade entendo a possibilidade de escolher 3 ou 4 marcas diferentes de pasta dentífrica que provavelmente vêm da mesma fábrica. Isto ou escolher uma infinidade de bens de prestígio, que se avariam ao fim de determinado tempo, mas que entretanto me conferiram prestígio a mim, que sou mediaticamente convencido que o prestígio social através da conquista material é o pináculo de felicidade na vida. Não, já se provou no passado que a nacionalização só traz guerra, fomes, pestes e corrupção, e nem interessa quais as condições e especificidades pois vi na televisão com os meus próprios olhos. A propriedade e a colectivização de sectores da vida pública são hoje em dia um dos temas mais proibidos pela comunicação social , que como bem sabemos é o barómetro da opinião pública ou pelo menos da sua apreensão do que se parece passar. O primeiro passo para resolvermos aquilo de que nos queixamos não é gritar, mas sim colocar todas as possibilidades. É mesmo verdade que o Estado  gere mal?Como e porquê. Se em consciência for verdade, após crítica partir então para outras soluções sem descartar nenhuma só porque temos ideias feitas em relação a ela.

Do que foi dito temos ainda de pensar na transmissão de propriedade e em justiça social.
Basta ao senhor Paulo Azevedo não ser um completo inapto, e ensinar a sua descendência a não o ser também, que até à nª geração os seus descendentes estarão em vantagem com os meus a não ser que eu os condicione a serem tão ambiciosos que embarquem numa vendetta/mimese empresarial para superarem a riqueza do clã Azevedo, mas isso não é garantido. Ou seja, se a acumulação de riqueza parece compensar o dinamismo de alguns a assim conferir-lhes destaque em relação aos outros, porque é que essa acumulação pode ser transmitida aos descendentes perpetuando a desigualdade social através das gerações? Se o esforço é o critério que justifica a riqueza, porque é que pode ocorrer que um preguiçoso só porque nasceu rico, possa permanecer rico? Como se pode medir a quantidade de esforço despendida por exemplo entre o senhor Catroga e um trabalhador braçal de igual idade e tempo de trabalho, de forma a equilibrar a diferença de reformas?
A acumulação de capital permite várias coisas, aumento da longevidade, desenvolvimento de uma mentalidade competitiva, destreza em manipular grandes somas de capital, e pensamento conservador para manter o estatuto e benefícios que se 'adquiriu'.
Permite até, na folga material, a associação de folgados a outros folgados para o desenvolvimento de manobras para se ir mantendo a folga e até aumentando a acumulação de material. Ao mesmo tempo que se nega aos despojados, aos geneticamente inferiores, os falhados da vida, a pertinência da sua associação. E vexando-os porque não produzem mais, consumiram acima das suas possibilidades e se os incentiva a programas de eugenia e controlo demográfico indirecto.



É a lei da propriedade que origina aquilo que uns designam por 'luta de classes'. Nessa luta, uns possuem meios de produção, outros possuem algo que é a força de trabalho, que parece ser algo ao mesmo tempo intrínseco ao trabalhador, e extrínseco ao trabalhador, o que parece ser confuso.
Uns quantos adquirem e transmitem propriedade, outros perdem-na. É a vida. Mas numa civilização em que se conseguiu uma acumulação material e uma alienação considerável de uma maioria populacional, só o escravo não percebe que o é, e a associação dos que apenas possuem a prostituição do seu corpo e mente torna-se aparentemente obsoleta, ao passo que a clara consciência de uma posição de destaque de quem possui os meios de gerar 'riqueza', permite manter essa mesma riqueza.


II

Um pouco por todo o mundo, da Islândia ao Egipto, do Equador à Turquia, os processos globais de concentração de capital provocam reacções mais ou menos espectaculares e que invariavelmente acabam por perder força e a revolução invariavelmente transforma-se em contra-revolução.
Na Islândia, das geniais reformas, a uma nova constituição, passou-se à retomada do mesmo governo responsável pelo descalabro. Parece que só a direita sabe mexer em dinheiro. Quando se instala algum bem estar, naturalmente o cidadão com desafogo e segurança deseja manter o que acha que conseguiu.
Chega-se então ao Estado presente no qual cada sujeito quer viver inebriado pela corrosão da conformidade.
A acumulação de propriedade conduz ao conforto, não ao conforto que decorre da amenização das condições de vida, mas ao conforto doentio e alienante. Não queremos só saborear o mexilhão, mas sim comer até vomitar, as ostras.
é irónico falar em amenizar as condições de vida, desde a revolução microeléctrica, pois desde aí que somos consumidores e não já o velho homo faber. Construímos um mundo virtual de sombras e pó no qual o excesso de conforto é a ilusão que nos mantém escravos e nem a evidência ecológica permite um clarificar das consciências, a não ser quando é evidente que os envernizados cidadãos dividem e despejam o lixo em contentores coloridos que quando chegam à incineradora vão todos para queimar para o mesmo sítio, ou quando entrega o secador no electrão, para pagar a sua boa consciência mesmo sabendo que será embalado num contentor para ser enviado para um país de 3º mundo onde será desmontado e o plástico fica lá mas o cobre retorna para a Europa. Bem feito, quem manda os 3º mundistas não serem dinâmicos?!...

Construímos a nossa sociedade baseada em má fé, em pequenos, insustentáveis, e fúteis prazeres.
O nosso 25 de Abril também foi assim, esperançoso e cheio de boas intenções, mas cedo corrompido sempre pela dinâmica de amealhamento. Hoje, tal como na Expansão que abriu os mercados mundiais no século XV, a burguesia ascendente é assimilada na sociedade do privilégio, autêntico camaleão transtemporal, os operários do Verão quente adquirem os 'boca de sapo' e tornam-se doutores e operários de escritório, de colarinho branco e dignidade superior.
É essa classe média que satisfeita pelo seu provinciano aderir a uma sociedade 'internacional' promove a existência de um arco governativo responsável, que é engrossado com os milhares de retornados com ideologia reaccionária que afluem ao país que anteriormente os deixava a morrer sós em terras do Ultramar. Organiza-se a maior ponte aérea para trazer o robustecimento conservador para terras onde os malandros comunistas grassavam, numa manipulação tantas vezes vista e agora repetida até à exaustão por telejornais de  hora e meia de idiotice superficial.

Há sempre uma dinâmica que se repete, entre revolução e conservação, entre espoliados e remediados. Enquanto continuarmos a cantar o mesmo fado, não vale a pena aprender a propriedade dos ritmos.
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